quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Conversas sobre Educação


São cerca de 50 minutos e sabemos que nem todos têm disponibilidade (nem interesse!) para estar - agora - a ver Plano INCLINADO de Mário Crespo na SIC Notícias. Mas o programa de sábado passado era sobre o ensino básico e secundário e a convidada foi a professora de secundário Maria do Céu Vieira (MCV), para conversar com Nuno Crato e Henrique Medina Carreira. Propomos reproduzir algumas das frases ditas e comentá-las:

1. Quem faz os PROGRAMAS DE PORTUGUÊS trai-se porque põe em evidência uma grande “ignorância e falta de amor pela língua, cultura” e literatura portuguesa. (Maria do Céu Vieira)

AS: admitindo fragilidades nos programas, parece-me de uma absoluta injustiça falar assim de quem elaborou os novos programas. As críticas devem fazer-se nos momentos e órgãos próprios, com propostas concretas e positivas de melhoria. Não desta forma. Além disso, afirmar que o discurso dos novos programas não entra nas suas aulas é apresentar um retrato dos professores de português que não corresponde à realidade e que em nada valoriza a imagem dos docentes.

BW: MCV ficou mediaticamente conhecida por mostrar que os manuais escolares traziam coisas tão aberrantes quanto o concurso do Big Brother. Ignora que o problema dos alunos portugueses é a iliteracia funcional. Eles sabem ler e até podem interpretar Camões, o problema é não saberem preencher um impresso, não saber interpretar uma lei... E isso também tem que se aprender na escola e é nas aulas de Português.

2. Erros nos novos programas

Quando MCV exemplifica estes erros referindo-se ao facto das OBRAS DE LEITURA RECOMENDADAS pelos programas serem do Plano Nacional de Leitura (PNL), "que, apesar de ter bons objectivos, tem muito LIXO”. Defende ainda que tem de existir na escola um CÂNONE DE AUTORES. Quanto a este mesmo assunto, Nuno Crato comenta que em Inglaterra todos os alunos conhecem Shakespeare e que “deve haver um cânone mínimo”.

AS: Bem sabemos que o PNL procura integrar obras para todos, o que significa ter obras para graus de leitura/interpretação distintos. Mas daí até se poder afirmar que há muito lixo, parece-me que vai uma longa distância.
Só quem não conhece os programas de Português pode afirmar que os nossos alunos não têm os "clássicos" nos programas. Dou o exemplo de Camões. Neste momento, obrigatoriamente, os alunos estudam este autor três vezes: Os Lusíadas no 9.º ano; poesia Lírica de Camões no 10.º e, novamente, Os Lusíadas no 12.º. Nalguns casos, estudam o autor quatro vezes, no caso das escolas que no 8.º ano adoptam como leitura extensiva Os Lusíadas contados aos mais pequenos de João de Barros.


BW: É um facto o PNL procura agradar a gregos e a troianos. Mais uma vez, temos um país a muitas velocidades e se Sophia parece ser fundamental para todos, a verdade é que nem todos lá chegam ou querem lá chegar! Ainda ontem, numa livraria, uma menina de nove anos tinha O Cavaleiro da Dinamarca na mão e a mãe disse-lhe: "Leva antes este que é mais engraçado! Olha as imagens" - era um livro com 365 anedotas...
Como me dizia, há semanas, a responsável da rede de bibliotecas escolares Teresa Calçada, há livros muito bons com ilustrações média-baixa e vice-versa e a imagem também faz parte da leitura, por isso - digo eu: quase tudo cabe no PNL! Quanto ao Shakespeare, a experiência inglesa mostra que muitos meninos começam a ler biografias de jogadores de futebol como o Beckham para, talvez, chegarem ao autor...

3. Quanto à MATEMÁTICA, Nuno Crato refere como principal problema dos novos programas este desejo de modernidade que se concretiza em opções, na sua perspectiva, erradas e perigosas.


AS: Percebo e concordo. Ora vejamos. Abolir do ensino o treino de algoritmos (por exemplo, memorização da tabuada, de cálculos ou fórmulas) não apenas contraria as recentes tendências que defendem de que a memória deve ser treinada como cria dificuldades aos alunos.

4. Nuno Crato apresenta os mais recentes números do PISA. Destaca os fracos resultados de Portugal (comparando-os, por exemplo, com os do Canada). “por cima das questões gerais há questões políticas” que explicam estes resultados.


BW: O problema já identificado pelos professores é que sempre que o Governo muda, ou o ministro da Educação, há novas maneiras de olhar para a Educação, quando devia haver um consenso.

5. QUANTIDADE versus QUALIDADE

Medina Carreira fala de outro ponto de vista e afirma que “ antigamente desprezava-se a quantidade”. “hoje há o desejo de apresentar a quantidade e a qualidade é absolutamente secundária ”.
AS: Nem sempre quantidade e qualidade andam de mãos dadas. A democratização do ensino tem este reverso da medalha. Mas continua a ser obrigação da escola proporcionar a qualidade.

6. Medina Carreira fala da DISCIPLINA nas salas de aula.


AS:
É verdade, os professores enfrentam hoje desafios ao nível da disciplina que não se verificavam noutros tempos. O convidado referia a questões dos telemóveis. Eu acrescentava a questão da imagem e autoridade dos professores. O gosto dos alunos pelos saber e pela escola, o consequente respeito pela figura do professor.

BW: Isabel Alçada, nas poucas intervenções que tem feito, tem sublinhado o papel dos pais. A importância destes educarem os filhos não só para o respeito (pelos professores), mas para a responsabilidade (do seu trabalho na escola).

7. Voltando aos PROGRAMAS todos destacaram a necessidade dos programas serem elaborados por especialistas e não apenas por pessoas da educação.

BW: É o medo do "eduquês" de Nuno Crato a vir ao de cima! Mas é também o definir para que serve a escola: só para transmitir conhecimentos ou para preparar para o mercado de trabalho? É que se a segunda opção também for tida em conta, então é preciso chamar outras pessoas para fazer programas que não sejam demasiado teóricos.

8. “Nos RANKINGS, as escolas públicas estão a vir para baixo e as privadas estão a vir para cima”.

BW: Os rankings revelam sempre uma coisa: seja qual for a escola, o que interessa são os alunos que fazem os exames e não os professores! E quais são as escolas que ficam nos primeiros lugares? As privadas e públicas que recebem alunos de classe média, média-alta, filhos de pais com formação superior e que além das aulas têm explicações! Ou seja, os bons resultados devem-se ao trabalho intensivo dos estudantes e às explicações, mas quem fica com a fama são as escolas, situadas em bons bairros das principais cidades do país!

2 comentários:

  1. Há algumas inverdades neste discurso. A ligação ao PNL é sobretudo ao nível do 2º ciclo. No 3º há um corpus textual, que incui Gil Vicente, Camões, entre muitos outros...
    No caso do 2º, a escolha recai no professor, não será este competente? Não é este professor de Português?
    Os programas devem ser bem lidos antes de criticados. Um bom professor faz isso e Maria do Carmo Vieira desiludiu-me nesta entrevista. a crítica não deve ser baseada em meias-verdades.

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  2. Nuno Crato apresenta as características do novo Programa de Português do Ensino Básico: apresenta resultados esperados e descritores de desempenho muito claros e um leque variado de percursos de aprendizagem. O corpus textual obrigatório inclui os clássicos portugueses incontornáveis. Tudo isto está lá. Basta ler para saber o que é que o aluno precisa de saber e como deve ser enquanto utilizador da língua portuguesa.

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