domingo, 28 de fevereiro de 2016

Olhar para o bullie sem medo

Os seus três filhos foram vítimas de bullying, conta uma mãe durante o encontro "Como preparar os nossos filhos para comportamentos violentos na escola?" que um grupo de pais do Montijo organizou no sábado, na biblioteca municipal.

Todos foram porque chegaram às respectivas escolas a meio dos ciclos, quando as turmas estavam formadas e os amigos já feitos. Eles chegaram e foram ignorados, maltratados ou mesmo agredidos. As crianças acabaram por contar em casa o que se passava – um aspecto importantíssimo: pormos os nossos filhos a dialogar connosco! – e a mãe perguntou: mas quem é esse menino? Como é que ele é?
Invariavelmente eram crianças infelizes, oriundas de famílias destruturadas ou com outro tipo de problemas, descobriu. Aquela mãe compreendeu que aqueles meninos precisavam de ajuda e foi isso que ensinou aos filhos. "Agora são amigos."

Foi um testemunho tão bonito!
Mas, claro que nem sempre acaba bem. Neste caso eram crianças ainda do 1.º ciclo, mas se lhes for dada uma mão naquela altura das suas vidas, talvez deixem de ser agressores e se tornem miúdos "normais". À medida que vão crescendo a redenção torna-se mais difícil, acredito, mas não impossível.

Diz o Jornal de Notícias, na sua edição deste domingo, que os crimes nas escolas sobem há três anos.
Há um trabalho grande a fazermos em família: educar os nossos filhos para o viver com o outro, para respeitar os companheiros, para saber fazer cedências, para não ser totó, mas também para não ter a mania.
Há um trabalho enorme a fazer nas escolas: o estar atento ao que se passa dentro da sala de aula, no recreio, na cantina, na biblioteca (e não são só os professores, mas o outro pessoal); o promover actividades de sensibilização para esta questão; o de aplicar castigos adequados e não se limitar a suspendê-los ou expulsá-los de onde estão.

Há um trabalho imenso a fazer pelo Ministério da Educação, pelo Governo: por mais pessoas nas escolas, um funcionário a tomar conta de recreios cheios é impossível. Por mais técnicos nas escolas, psicólogos, educadores sociais, assistentes sociais, pessoas que possam identificar o problema e arranjar maneira de o sanar logo do princípio; que saibam como falar com as crianças mais problemáticas, com as suas famílias; que possam encontrar meios destas famílias terem uma vida com mais qualidade.
Eu prefiro que o Estado dê trabalho a mais pessoas, que combata o desemprego, que ofereça um serviço educativo de qualidade, do que um que aumenta a ADSE aos funcionários públicos e aos seus filhos até aos 30 anos ou dê subvenções aos políticos.
BW

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

É importante saber rir das rotinas

Acho saudável conseguirmos rir de nós próprios e das nossas "happy busy lifes", como diz uma amiga minha.
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No que diz respeito ao meu papel de mãe e à vida e rotinas familiares, encontrei a solução ideal para soltar esse riso e pôr todos, pai, mãe e filhos a rir do quotidiano das personagens, que é também o nosso. Trata-se da série cómica francesa "Fait pas ci, fait pas ça" (traduzida para "Pais desesperados"), que tem a vantagem de ser um programa passível de ser feito com os mais novos cá de casa.
Hoje dei comigo a pensar se me identificaria mais com a família Lepic, estranhamente conservadora, ou Bouley, moderna e "cool" e se os meus filhos me veriam mais como a mãe Fabianne ou como a Valérie. Apesar de não lhes ter feito esta pergunta, cheguei à conclusão que me revejo em ambas. Na primeira, no desejo de "ser" super mãe (no caso dela de quatro filhos), de dar conta de tudo e, por isso, muitas vezes, desesperar. Resultado: mau humor e stress salpicados por alguma gritaria pela casa fora. Por outro lado, acho que também me identifico com a Valérie, uma mãe mais moderna, mas com imensa dificuldade em assumir que gosta de mandar, que adora a sua profissão e que não percebeu, ainda, que os anos passaram (e que... já vai ser avó).
A vida em família nem sempre é um mar de rosas, todos sabemos. Passamos a vida a dizer aos miúdos "Fait pas ci, fait pas ça", como a música do genérico, que dá título à série, repete insistentemente (vale a pena ouvir!). Mas, mesmo assim, somos todos felizes. Acho que os meus filhos se divertem, mas sobretudo creio que a série lhes permite perceber que as suas vidas atarefadas, que as rabugices, regras, zangas fazem parte da dinâmica (saudável) de uma família. E que, no fim, todos nos aceitamos e amamos assim. Saibamos rir mais das nossas rotinas. Acredito que será mais fácil viver com elas, mesmo quando o despertador toca cedo e parece que ainda não recuperámos do dia anterior.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Poema à mãe

No mais fundo de ti,
eu sei que traí, mãe

Tudo porque já não sou
o retrato adormecido
no fundo dos teus olhos.

Tudo porque tu ignoras
que há leitos onde o frio não se demora
e noites rumorosas de águas matinais.

Por isso, às vezes, as palavras que te digo
são duras, mãe,
e o nosso amor é infeliz.

Tudo porque perdi as rosas brancas
que apertava junto ao coração
no retrato da moldura.

Se soubesses como ainda amo as rosas,
talvez não enchesses as horas de pesadelos.

Mas tu esqueceste muita coisa;
esqueceste que as minhas pernas cresceram,
que todo o meu corpo cresceu,
e até o meu coração
ficou enorme, mãe!

Olha — queres ouvir-me? —
às vezes ainda sou o menino
que adormeceu nos teus olhos;

ainda aperto contra o coração
rosas tão brancas
como as que tens na moldura;

ainda oiço a tua voz:
          Era uma vez uma princesa
          no meio de um laranjal...

Mas — tu sabes — a noite é enorme,
e todo o meu corpo cresceu.
Eu saí da moldura,
dei às aves os meus olhos a beber,

Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim.
E deixo-te as rosas.

Boa noite. Eu vou com as aves.

Eugénio de Andrade, in "Os Amantes Sem Dinheiro" 

terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

Os filhos gastam-nos o nome

Cinco segundos depois da mãe sair do quarto, alguém grita:
- Mãeee!
- "Mãe" não é uma pergunta - é a resposta vinda da cozinha.
Nova interpelação:
- Mãe, vens aqui?
Mais um perfeccionismo da progenitora:
- Não percebi!
- Por favor? - lá se ouve do quarto.
Enfim, neste momento não há cedência possível.
Esta cena, já depois da hora de apagar a luz, repete-se, várias vezes, em cada um dos quartos, pelos mais variados e dispersos assuntos: o pão do lache da manhã seguinte com manteiga; o livro que ficou por pôr na mochila; as unhas que precisam de ser cortadas; o livro que é para entregar à irmã no seu quarto...
Nos dias bons, a conversa acaba assim:
 -  A tua sorte é que és lindo/a!
Nos mais tempestuosos, em que o cansaço e o trabalho nos toldam o discernimento e esgotam a paciência, as idas aos quartos acabam com um desabafo:
- Vocês gastam-me o nome!!!

E, se até agora só me posso queixar de os ouvir "gastar o meu nome", dou comigo a pensar que daqui a uns anos, que passarão mais depressa do que o tempo que decorreu desde o primeiro momento em que os peguei ao colo, corro o risco de deixar ouvir o meu nome. E, nessa altura, suspeito, vou ter pena de não ter lido mais uma história já depois da hora regulamentar de ir dormir; de ter cortado as unhas na cama, sobretudo quando isso já é uma competência deles; de ter deixado aquele mail por escrever só para ficar a olhar para eles.
Mas a vida é feita de tempos. E tudo tem o seu tempo. O tempo da saudade virá um dia, por isso, agora, vou lá ao quarto espreitá-los outra vez.

AS

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Vai ser assim o nosso futuro?

Os alunos de escolas de vários pontos do país entram no teatro. Vão assistir a um bailado. Antes de a peça começar e porque não estão familiarizados com este tipo de espectáculo, é-lhes feita uma explicação. Os meninos permanecem calados. Estão a ouvir? Não, estão nos telemóveis.
Do primeiro balcão é possível ver os lugares da plateia ocupados e as luzes que emanam dos ecrãs dos telefones. Será que ouviram a explicação?

Lembrei-me desta história que se passou há uma semana, num teatro em Lisboa, quando vi esta imagem de Mark Zuckerberg, o fundador do Facebook, durante uma apresentação da Samsung, este fim-de-semana. Os tipos com os óculos de realidade virtual são jornalistas que estão a assistir à conferência de imprensa. E as perguntas correm a Internet: este vai ser o nosso futuro?
Vemos os meninos e os pais nos restaurantes. Será assim em casa? Penso que sim.
Vemos os meninos dentro dos carros, com os ecrãs cravados nos bancos dos pais, como se não pudessem fazer uma viagem e ver a paisagem que os rodeia; como se não bastasse ouvir rádio ou um CD e cantarem todos juntos.
Vemos os adolescentes no pátio da escola. Estão todos juntos, mas estão nos telefones.
Vemos as pessoas nos transportes públicos. Não lêem um jornal, um livro, estão no telefone e não estão a comunicar, mas a jogar.
Alheados da realidade. Estamos alheados da realidade e esse não é o nosso futuro, mas o nosso presente. Por isso, não é difícil imaginarmos um mundo onde todos temos umas palas e não vemos passar o dono do mundo, ufano, feliz, milionário, a rir-se de todos nós, convencidos que estamos a ser muito modernos.
BW

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

Uma semana terrível para as crianças

Esta foi uma semana terrível para, pelo menos, três crianças que perderam as suas vidas.

As duas meninas, de 18 meses e de quatro anos, cuja mãe as levou em braços para o rio, numa tentativa frustrada de suicídio/homicídio, em Caxias. E a menina de cinco anos que estava sozinha em casa e caiu de uma varanda do 21.º andar, em Lisboa
O que se passa com estes pais? Com a mãe que agarra nas meninas provocando a sua morte e com os pais que vão jogar para o casino?
O que faz uma mãe ou um pai sentir-se dono da vida que deram? O que lhes dá direito de a retirar? Os especialistas explicam que se tratam de pessoas deprimidas, que acreditam que estão a proteger os seus filhos, que não há futuro para eles e, por isso, o melhor é morrerem com elas.
O que faz uma mãe ou um pai deixar uma criança pequena sozinha em casa? Lembram-se dos pais da Maddie, três bebés sozinhos num quarto de hotel, enquanto os pais jantavam. Desde quando os nossos interesses são superiores aos deles?

Não têm sido semanas, mas anos difíceis para Liliana e para os seus muitos filhos, que lhe foram retirados em 2011, pela justiça, e distribuídos por lares para adopção. Não era a família ideal, não tinha as condições ideais, as crianças não iam à escola, a higiene não abundava, mas havia amor. Parece que o amor não basta. Quem conhece casas de acolhimento (eu conheço duas) sabe que por muito bem que as crianças estejam – com horas certas para comer, com boa alimentação, com uma cama num quarto quente, com roupas lavadas, com regras, etc – falta-lhes sempre o mais importante, a família, o que os amigos da escola têm e eles não.

E quando eles pedem, pedem muito, nós dizemos que sim e acontece uma desgraça? Foi o aconteceu com o pai da miúda de 13 anos que a permitiu conduzir o carro, trazê-lo das traseiras da casa para a frente. Contudo, a rapariga perdeu o controlo e matou uma vizinha que estendia roupa dentro dos muros da sua casa. Podia ter sido pior, já que o pai, sentado no lugar do pendura, trazia o irmão bebé ao colo. Duas famílias devastadas, destruídas por causa do medo de dizer um "não", de enfrentar uma birra, de resolver uma zanga.

Estas não são dias fáceis para as crianças para quem desejamos o melhor do mundo. Queremos ser pais; não queremos, mas somos e depois? Quem nos ensina a ser pais? Faltam escolas de pais? Sim, mas também falta muito amor, estabilidade e bom senso.

BW

terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

Obras do projeto de leitura do 10.º ano

Nas voltas e voltas dos programas e metas, reconheço que recuperar a perspectiva cronológica no ensino da nossa literatura me agradou. Todavia, ainda não consegui interiorizar e apropriar-me das propostas de obras para o projeto de leitura (sim, porque muda o programa e muda a designação. Antes, o «projeto de leitura» era denominado «contrato de leitura». Adiante).
Para os curiosos, as metas estão disponíveis aqui. Na página 29, podemos ver quais as obras para leitura «paralela» às obrigatórias na sala de aula. Assim, advogam as metas que os alunos leiam uma ou duas destas obras por ano e a partir das suas leituras desenvolvam projetos que as relacionem tematicamente com o programa ou por géneros. Na lista do 10.º ano, que transcrevo abaixo, e que é a única ainda em vigor, vejo muitos títulos que pouco agradarão aos alunos. Não encontro alguns autores que, acreditava eu, fariam inquestionavelmente parte do cânone escolar. Encontro inclusivamente livros, ainda que em outras versões, que também constam das metas do 2.º ciclo (Robinson Crusoe). Outros que estão esgotados e os alunos dificilmente encontrarão. Alguns que alunos de 14 anos não perceberão. Uns de 20 páginas apenas (Quem me dera ser Onda). Alguns truncados, com a indicação explícita da leitura de "excertos". Deixados ao critério dos alunos? Dos professores? Ao acaso?
Sinto falta  de alguns grandes nomes de sempre da nossa literatura que, em harmonia, conviviam com novas gerações de autores portugueses na anterior lista da DGES , lista essa francamente "mais arejada", repleta de grandes nomes da literatura portuguesa e universal, e que deixava os alunos respirar, ir para além das «obras obrigatórias» da sala de aula, fazer descobertas e, para alguns, quem sabe, descobrir como é bom ler.

AS


Maalouf, Amin As Cruzadas Vistas pelos Árabes
Magris, Claudio Danúbio
Marco Pólo Viagens (excertos escolhidos)
Meireles, Cecília Antologia Poética (poemas escolhidos)
Moraes, Vinicius de Antologia Poética (poemas escolhidos)
Nemésio, Vitorino Vida e Obra do Infante D. Henrique
Ondjaki Os da Minha Rua
Pepetela Parábola do Cágado Velho Pérez-Reverte,
Arturo A Tábua de Flandres  Petrarca Rimas (poemas escolhidos)
Poe, Edgar Allan Contos Fantásticos
Rui, Manuel Quem me dera ser Onda
Scott, Walter Ivanhoe Shakespeare,
William A Tempestade Swift,
Jonathan As Viagens de Gulliver
Telles, Lygia Fagundes Ciranda de Pedra
Virgílio Eneida (excertos escolhidos)
Zimler, Richard O Último Cabalista de Lisboa
AA.VV. Antologia do Cancioneiro Geral (poemas escolhidos)
Alves, Adalberto O Meu Coração é Árabe (poemas escolhidos)
Amado, Jorge Capitães da Areia
Anónimo Lazarilho de Tormes
Andresen, Sophia de Mello Breyner Navegações
Brandão, Raul As Ilhas Desconhecidas
Calvino, Italo As Cidades Invisíveis
Carey, Peter O Japão é um Lugar Estranho
Castro, Ferreira de A Selva Cervantes,
Miguel D. Quixote de la Mancha (excertos escolhidos)
Chatwin, Bruce Na Patagónia
Dante Alighieri A Divina Comédia (excertos escolhidos)
Defoe, Daniel Robinson Crusoé Dinis,
Júlio Serões da Província
Eco, Umberto O Nome da Rosa
Énard, Mathias Fala-lhes de Batalhas, de Reis e de Elefantes 
Faria, Almeida O Murmúrio do Mundo: A Índia Revisitada
Ferreira, António Castro
Gedeão, António Poesia Completa (poemas escolhidos)
Homero Odisseia (excertos escolhidos)
Lispector, Clarice Contos
Lopes, Baltazar Chiquinho

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

Ser um exemplo para uma sombra que se quer gente!

Uma boa ideia!
Gosto quando as escolas se abrem aos pais e não os tratam com desconfiança como se estes não quisessem o melhor para a instituição onde os seus filhos passam a maior parte do tempo.
Gosto quando as escolas não desvalorizam os alunos e as suas famílias.
Gosto daquelas que não vivem para servir os professores, mas os alunos.
E feita esta declaração de interesses cá vai uma excelente ideia dos pais e que a escola acolheu para bem dos seus alunos.
A Associação de Pais e Encarregados de Educação da Secundária Filipa de Lencastre, em Lisboa, em conjunto com a direcção do agrupamento, criou um programa com o objectivo de os seus alunos terem uma oportunidade de conhecerem a realidade do mercado de trabalho. Como? Durante um curtissimo espaço de tempo, o aluno transforma-se na sombra de um profissional e acompanha-o no seu ambiente de trabalho.
Lembrem-se como eles têm tantas dúvidas sobre o que querem ser. Lembrem-se como não fazem ideia do que é um escritório, um laboratório, como funciona uma pequena ou grande empresa. Andar atrás de um advogado, de um analista, de um professor, de um economista, de um... pode ajudá-los a tomar decisões!
Tão simples e, pode ser, tão eficaz! Parabéns!
BW

domingo, 14 de fevereiro de 2016

Porque amar e gostar não são a mesma coisa

"É dramática a imatura não distinção entre o amar e o gostar, tão própria da nossa cultura. Posso gostar ou não gostar, gostar mais ou gostar menos. Mas não posso não amar. O gosto encontra-se ao nível do sentimento; o amor ao nível da vontade. Os sentimentos vão e vêm, tantas vezes sem controlo da nossa parte. Mas a vontade tem a ver com a decisão. Nenhum casamento dura uma vida inteira porque marido e mulher gostam um do outro 24 horas por dia, 7 dias por semana, 365 dias por ano. Um casamento (qualquer relação) dura porque ambos decidem que dure. Sim, porque se amam, mesmo que haja dias em que seja difícil gostarem um do outro."

P. Miguel Almeida, sj
 
Texto integral aqui.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

O amor que merecemos

É domingo de Carnaval, aparecem em bando, terão entre os 15 e os 18 anos, rapazes e raparigas, mascarados de zombies, fantasmas, colegiais, coelhinhas. Não há bem um tema, são só miúdos a brincar ao Carnaval. Para trás fica um casalinho que vem abraçado.
Até que ele, não percebo porquê, larga-a e atira-a contra a parede de um prédio, entre duas montras. Ela magoa-se no braço que embate contra a parede, faz uma careta e massaja-o. Mas quando olha para ele, sorri-lhe e assim que se aproxima dá-lhe uma bofetada. Amor com amor se paga.
Atrás de mim apitam e eu tenho de arrancar com o carro. E se estivesse no meio da rua, faria alguma coisa? Diria a ambos que aquilo não se faz, que amar não é desrespeitar, não é maltratar... É aquilo que vêem em casa? Reproduzem comportamentos vistos nos filmes e nos jogos? Acreditam que aquilo é amor?

Em The Perks of Being a Wallflower, um filme adolescente, uma das personagens diz: "Aceitamos o amor que achamos que merecemos."
E é isso que nos faz, quando temos baixa auto-estima, insegurança (e não só), aceitarmos pessoas que não nos merecem ou aceitarmos porque achamos que não merecemos mais do que aquilo...
Por isso, temos de ensinar os nossos filhos a amar e a respeitar o outro, mas também a amar-se e a respeitar-se. E ensiná-los a identificar as relações doentias, de domínio, de maus tratos, para que não caiam nelas, para que não façam parte do grupo que acha normal a violência no namoro e, por consequência, a violência doméstica.
BW




quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

São voltas e voltas sem parar

Mais notícias. Desta vez, são os diretores das escolas que se pronunciam sobre as mais recentes medidas tomadas pelo Ministério da Educação relativamente ao fim dos exames de 6.º ano, já este ano lectivo.
São voltas e voltas sem parar...
Estas são palavras de uma música dos Entre Aspas que me vem à memória quando penso no que temos vivido no ensino em Portugal. Reforma e contra-reforma. Proposta e contra-proposta. Programas versus metas. Depois novos programas e metas. Provas de aferição. A seguir, exames que, pouco tempo depois, deixam de ser exames e passam a ser, de forma politicamente correta, apelidados de Provas Finais. Entretanto, menos exames. Novas provas de aferição. Pelo meio, Associações de Professores em desacordo com propostas do ME; Conselho Nacional de Educação com propostas diferentes das ministeriais. Atrasos generalizados no cumprimento dos programas (leia a notícia aqui). E hoje CE defende exames e provas de aferição. E a seguir?

Esta entediante enumeração resume meia dúzia de anos da nossa educação, em constante mutação e desacordo. Revela a forte instabilidade que a Escola vive em Portugal.

Diz a mesma música que
«São voltas e voltas sem parar
Em sonhos nocturnos
Em sonhos de encantar
Muitos enredos histórias reais.»

São, de facto, mundos reais. Mas não são sonhos. Às vezes parecem pesadelos, estas voltas e voltas sem parar. Sonhos que pouco têm de encantar.

AS

O que estão a fazer esses pés no ar?

Já disse esta frase vezes seguidas: Gosto muito de ir às escolas falar! Seja do Olimpvs.net para os alunos; seja nas conversas com os pais. Gosto. É o meu contacto com a realidade. 
Gosto da forma como me acolhem, das perguntas que me fazem, da curiosidade com que ouvem o que digo. E hoje, no Colégio Monte Maior, em Montemor, não foi excepção. Eles ouvem curiosos e fazem perguntas pertinentes.
O pior é o comportamento.
A entrada no auditório, onde estavam as turmas todas do 5.º, foi feita com barulho. Não foi fácil sentarem-se e depois de sentados, não foi fácil calarem-se.
Estaria a falar há uns dez minutos, sem microfone, quando uma aluna das últimas filas me pergunta se não posso falar mais alto. Já com a garganta a arranhar, respondo-lhe: "Eu já estou a gritar, talvez se os teus colegas se calarem consigas ouvir." 'Ó meu Deus, agora parecia mesmo uma professora', pensei.
O barulho transformou-se em burburinho que foi constante durante os 90 minutos. Suportável, mas não o ideal. 
Há uma aluna que me ajuda a contar uma história da mitologia grega e, quando volto a olhar para ela, está toda deitada na cadeira confortável do auditório, com as pernas traçadas e um pé no ar. Aquele pé está ao nível de um braço no ar, tapando a vista do que está atrás dela. "O que estão a fazer esses pés no ar?", pergunto, já com microfone. A garota baixa os pés, mas mal me viro, torna a espetá-los, marcando a sua posição. 'Não me vou incomodar', penso, 'não sou sua mãe, nem sua professora, estou de passagem.'
"Como é que você faz para ter tanta imaginação?", pergunta uma aluna. "Como é que a senhora ou a autora faz... assim é que devias perguntar", corrijo. 'Eu hoje estou impossível...', digo para os meus botões. "Você já foi ao Brasil?", "A senhora...", insisto com um rapazinho, mas ele nem percebe.
No final, alguns agradecem e saem; outros ficam para os autógrafos. São todos simpáticos e amorosos, brincam, fazem graças, sem serem mal-educados. 'Têm dez anos, ainda têm muito tempo para aprenderem', concedo.
A professora que me acompanha à porta pede desculpa pelo comportamento que, reconhece, não foi o melhor, mas também eles estão desde manhã de actividade em actividade. É a semana cultural e as iniciativas são muitas. 
Penso na escola a tempo inteiro, no cansaço dos miúdos que degenera em pés no ar e impertinência. Se antes de conversar com a docente, estava já preparada para a alertar para a necessidade de trabalhar o comportamento, agora sinto pena dos miúdos que, quando saírem dali, ainda vão para casa fazer TPC. Deixá-los ter os pés no ar... Mas até quando?
BW 


terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

Liceu ou escola secundária?

E, a pouco e pouco, a palavra "liceu" regressa ao léxico de alguns. Dos que andaram no "liceu" e o esconderam nos anos pós-25 de Abril por uma questão de sobrevivência; dos que desejavam ter andado no "liceu" dos pais, mas andaram na secundária; dos que têm os filhos nos colégios e, em determinada altura da vida escolar dos infantes, os mudam para a escola pública, mas chamam-lhe "liceu" para suavizar a decisão.

Para esses, "liceu" é uma palavra nobre. É uma "metáfora" como chamar "kleenex" aos lenços de papel, responde-me Laurinda Alves num post do FB. Acho que o que queria dizer era "sinónimo". Mas, de facto, é uma metáfora para tudo o que digo no primeiro parágrafo. É uma metáfora para uma vida que já não existe, para uma escola de elites.

No tempo dos liceus, nem todos lá chegavam. As classes mais baixas acabavam nas escolas comerciais e industriais.
Ah, mas hoje também não chegam todos à secundária, dir-me-ão. Chegar, chegam. Não chegam é todos de maneira igual. Uns chegam pelos cursos científico-humanísticos (maioritariamente são os filhos e os netos dos que andaram no "liceu") e outros pelos cursos do ensino artístico, vocacional, profissional e recorrente.
Portanto, as diferenças mantém-se, argumentarão. Sim, é verdade, mas estão todos na mesma escola.

E são todos tratados da mesma maneira? Não, lamento. A escola que devia ser promotora da igualdade e de ascensão social, mas continua a ser o seu contrário e contribui para que o fosso se mantenha entre os meninos do "liceu", os que vão ter as profissões liberais; e os outros, os que vão ser mecânicos, electricistas, programadores.

Quando vou às escolas, observo que os miúdos não se misturam. É fácil identificar, só pela postura e roupa que vestem, os que andam nos cientíco-humanísticos e os outros.
Os professores também me dizem que é fácil distingui-los, os primeiros estão motivados para estudar e, geralmente, comportam-se melhor em sala de aula; os outros nem sequer sabem estar. 
Aliás, os professores também parecem ser de primeira e de segunda, os que leccionam as disciplinas que vão a exame nacional e os outros.
Como as próprias escolas, os antigos "liceus" com melhores resultados nos rankings feitos com base nos resultados dos exames nacionais, e as antigas escolas comerciais e industriais com menos turmas dos científico-humanísticos, logo, com resultados menos bons.

E, então, por que estou eu tão incomodada com o "liceu" se algumas escolas secundárias se comportam como "liceus"? Por todas as razões que enunciei! Porque a escola continua a ser desigual e não devia. Porque se continuarmos a chamar-lhe "liceu" estamos a dizer isso mesmo, que há meninos de bem e miúdos chungas. Porque, tal como os estudantes, todos os professores se devem sentir de primeira, estarem motivados e oferecer um melhor ensino. Porque todos têm direito a uma educação de qualidade, seja em que tipo de ensino for!
BW
PS: Os meus pais e os meus avós andaram no liceu, já eu e os meus filhos frequentámos escolas secundárias, antigos liceus femininos, que também eram diferentes dos masculinos, mas isso fica para outra vez!

domingo, 7 de fevereiro de 2016

Podem os livros fazer-nos mal?

Quando das convulsões de Abril de 1974, o meu tio materno foi para as Américas, mas não para o Brasil, para os EUA, onde grande parte dos seus cunhados (irmãos e irmãs da minha tia) já se encontravam, fruto do conhecido êxodo açoreano.
Os meus avôs foram aos EUA, visitar a família, às compras, ao médico... O meu avô vinha sempre deslumbrado. O meu avô acompanhava a política norte-americana com o mesmo fervor com que nós acompanhamos o Obama, a Clinton, o Sanders ou mesmo o Trump. O meu avô só tinha coisas boas a dizer da América, do trabalho do filho e da nora, professores universitários, dos netos, em excelentes escolas, da organização da sociedade, dos arranha-céus, do primeiro mundo!
Todo este elogio deixava-nos desconfortáveis. Os netos da América eram melhores do que nós... Era uma festa quando os meus primos chegavam, para passar o Verão na praia, na quinta ou no pinhal. Éramos sete, éramos aventureiros, éramos os maiores! Mas, a verdade, é que quando se iam embora e o meu avô começava a suspirar de saudades e a comparar-nos com eles – "comportem-se como os vossos primos!", mas eles implicavam tanto como nós, só que o avô não via...

De repente, a América parecia-nos uma porcaria! Também à minha mãe a América lhe fazia comichão (talvez pela mesma razão que a nós) e as conversas com o pai terminavam invariavelmente da mesma maneira: "A América é um país de emigrantes que foram expulsos dos seus países, de extremistas religiosos, de loucos."

Lembro-me muitas vezes desta ideia da minha mãe quando leio as notícias dos tiroteios nas escolas e nas universidades, quando vejo a defesa acérrima pelo porte de armas, etc. E lembrei-me quando lia o texto da Isabel Lucas, no PÚBLICO, sobre estudantes universitários norte-americanos que consideram que a literatura lhes pode fazer mal.

É o políticamente correcto em todo o seu esplendor. Não podemos ser expostos ao rapto, à violação, à violência doméstica, ao assassínio, à morte na literatura, mas estas podem entrar-nos pelos olhos adentro nos jornais, nas televisões ou na Internet. Custa-nos mais o rapto de Europa que as migrações forçadas de refugiados.
Não podemos levar um banho de realidade quando somos crianças. Como aqueles pais que compram os livros das histórias onde ninguém morre no fim, onde não há castigos sanguinários, onde todos são muito bons e felizes.

A literatura oral ou escrita – quem não se lembra das histórias de terror contadas numa noite fria num acampamento; ou, o que são os contos de Hans Christian Andersen como o da menina dos fósforos, etc  – serve para isso mesmo, para aprendermos a combater o medo, para compreendermos que o mal existe, para o conseguirmos identificar, para crescermos.

Quando estamos a escrever o Olimpvs.net e seleccionamos as histórias da mitologia ou dos heróis da Grécia Antiga para contarmos aos nossos leitores, por vezes, também temos essa preocupação: ui, vamos impressioná-los com uma coisa horrível... Mas, a vida é mesmo assim, as coisas más existem e estão aí, ao virar da esquina. Como as boas! Porque a literatura é feita de vida e vida é o que queremos para os nossos filhos... e para os tontos dos estudantes americanos, vá...
BW

sábado, 6 de fevereiro de 2016

Olimpvs.net - na minha antiga escola



Ir às escolas falar aos nossos leitores é sempre um prazer. Ouvir as suas perguntas, sugestões, ver os seus rostos espantados quando lhes fazemos confidências sobre os nomes das personagens da coleção ou outros pormenores, tudo isto traz mais vida à nossa feliz, mas algo solitária, atividade de escrita. Desta vez, tudo isso se repetiu, com sucesso acrescido, na Escola António Bento Franco, sobretudo devido às sessões de sensibilização previamente dinamizadas pela professora bibliotecária.

Mas, para além destes fatores, acresce a esta visita a particularidade desta ter sido uma das escolas onde eu estudei (e que estreei!).
Poucos instantes depois de passar o portão, recordei com nostalgia alguns espaços, a biblioteca, claro, mas também o polivalente, o bar e os seus folhados de salsicha. Recordei colegas, momentos, professores. Vários. Particularmente de Português. Uma professora que ainda tenho a alegria de ver frequentemente, a professora Conceição Jorge, e um professor (agora noutra escola,  certamente) que gostava de fotografia e arte e que, um dia, fez retratos a preto e branco de todos os alunos, o professor Fabião (e que não deve fazer a mínima ideia de que me ficou na memória).

Nas sessões, enquanto falava dos heróis da mitologia e da origem dos Jogos Olímpicos, fui reconhecendo alguns rostos – filhos de antigas colegas e amigas. No fim, foram outros que se vieram apresentar. E, por fim, com um bonito ramo de flores, vejo surgir o meu antigo professor de matemática, atual Diretor da escola, o professor Alfredo Carvalho.

Todas as visitas às escolas são momento de alegria. A esta, somaram-se, rostos, cheiros, sonhos e memórias que, no passado, eu não sabia que tornariam o  meu presente mais feliz.
Ana Soares





sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

Educar: regras simples para serem cumpridas

À Visão, o psicólogo Javier Urra conta que o que o fez interessar-se pelo tema da educação foi uma cena que presenciou ainda era estudante.
"Um miúdo empurrou a mãe e deixou-a caída no chão. Acabou a tropeçar nela. A mãe levantou a cabeça e perguntou-lhe: 'Magoei-te?'"
Quantas cenas destas já presenciamos? Quantas já protagonizamos?

Às vezes, quando vou para ralhar, começo assim: "Desculpa, mas..." Um dia, enquanto conversava com a psicóloga educacional Maria Dulce Gonçalves, esta interrompeu-me e perguntou-me: "Mas se vai chamar a atenção porque pede desculpa?"

Não podemos confundi-los, se vamos ralhar, não pedimos desculpa, se não por que estamos a ralhar? Porque temos medo de o fazer? Eles vão deixar de nos amar se o fizermos? Não, diz Urra, eles precisam de uma parede, senão vão sempre em frente, sempre em frente e perdem-se...
E nós não queremos que eles se percam, pois não?

Por isso, toca a não ter medo de pegar o touro pelos cornos – atenção! Não estou a chamar animal às crianças, mas sim à forma como temos medo de educar, à forma como não nos queremos incomodar para termos o tal tempo de qualidade, à forma como ignoramos algumas coisas porque as achamos pouco graves – só que elas acumulam-se, acumulam-se e, de repente, não está um touro, mas um elefante na sala...

Aqui fica um excerto da entrevista que fiz a Javier Urra, que veio a Portugal lançar o último livro "O Pequeno Ditador Cresceu", A Esfera dos Livros.

Mas como é que se tem um filho ditador? Os pais demitem-se de serem pais?
Os pais têm medo de ser pais. Têm medo de dizer “não”, de enfrentar os filhos e de os castigar. Há pais que têm de ser adultos. Uma coisa é ser maior e outra é ser adulto. Ao centro chegam muitos pais que são médicos, professores, militares – acostumados a mandar em milhares de pessoas –, um filho dá-lhes um pontapé e dizem apenas “isso não se faz”, em voz baixa e sem convicção.
Porquê?
Porque querem comprar o amor dos filhos. Claro que há filhos que se portam bem e outros que dormem mal, comem mal. Mas aos pais cabe educá-los. Uma coisa é a personalidade, outra coisa é o temperamento e outra é o carácter.
BW

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Olá! Ainda por cá andamos!

A semana passada recebi um email que terminava com um lamento: este blogue estar morto.
Hei! Não está!
Andamos por outros lados, preocupadas com outras coisas, com as cabeças cheias e as mãos parecem não chegar a tudo... Não temos tempo!
Falta-nos o que falta a tantos: tempo.
Tempo para escrever com inspiração.
Tempo para estarmos com quem gostamos.
Tempo para fazermos o que desejamos.
E, esperava-se que com o passar do tempo, ganhassemos tempo! Dias, horas, minutos, em vez de debitarmos coisas como "tempo de qualidade". O que é isso, se não há tempo?!
Vamos tentar regressar!
Obrigada aos que vão passando por cá, à nossa procura!
Beijos,
BW