quarta-feira, 30 de setembro de 2015
sexta-feira, 25 de setembro de 2015
A conversar com os pais, a convite da escola
Esta tarde estarei na Escola Básica Eugénio de Andrade, no Porto, para conversar com os pais. O convite é da escola que almeja por um bom relacionamento com as famílias!
BW
BW
sábado, 12 de setembro de 2015
Todos somos refugiados
Quando a Segunda Guerra começou, o meu avô Wong desmantelou as fábricas que tinha em Shanghai e montou-as nas montanhas, no interior, para evitar que fossem bombardeadas. Foi ali que o seu primeiro filho nasceu. Depois de sete dias de trabalho de parto, foi tirado com fórceps por uma curiosa e não correu bem pois todo o seu sistema locomotor ficou afectado. Contei esta história na quinta-feira, durante o encontro Ler no Chiado, em que se falou do Diário de Anne Frank (as conversas são como as cerejas).
Terminada a Guerra Mundial, os chineses enfrentaram a Guerra Civil. O meu avô era apoiante de Chiang Kai Shek e isso custou-lhe as fábricas e as propriedades (custar-lhe-ia mesmo que fosse apoiante de Mao, pois tudo seria nacionalizado). A fuga era a única solução. Mais uma vez, a fábrica foi desmantelada e mandada para Hong Kong e com ela a família e inúmeros funcionários. Conta-se que a família, então já com três filhos, todos rapazes, apanhou o último avião com destino à colónia britânica. Depois disso, Mao mandou fechar as fronteiras.
Foram refugiados. Eram chineses da "mainland" e sempre foram tratados como tal. Isso significa que não tinham os mesmos direitos que os que tinham nacionalidade britânica. Em Hong Kong foram tratados como cidadãos de segunda, eram apátridas. À excepção da benjamim da família, a menina por que tanto ansiavam, e que já nasceu em solo britânico.
Eu digo que são refugiados. O meu pai diz que não são porque chegaram de avião, com dinheiro, compraram prédios, montaram uma fábrica e deram trabalho a muitos. Certo, mas saíram do seu país porque corriam risco de vida. Ficar na China era enfrentar a nacionalização dos seus bens (o que aconteceu), era a possibilidade de irem para campos de reeducação, era a fome, o terror, etc.
Depois de um minor em Economia, o meu pai foi para a Alemanha fazer Engenharia Mecânica na mesma universidade onde o pai tinha estudado no final da década de 1930. Não foi fácil sair porque era apátrida. Chegou à Europa com uma bolsa para estudar e ganas de trabalhar para se manter sem apoios de casa.
Depois do curso concluído, veio para Portugal trabalhar. Não era emigrante, diz-me, porque foi convidado para vir abrir uma fábrica. Também aqui as nossas opiniões divergem. Eu digo que é emigrante, como são os enfermeiros que partem para o Reino Unido com trabalho garantido ou os médicos que seguem para a Austrália com contrato.
Também posso falar do irmão da minha mãe que não viu futuro no 25 de Abril, temeu uma guerra civil, a vitória do PCP e emigrou para os EUA com três filhos pequenos. Aliás, ainda me lembro das arcas, compradas para viajarmos para o Brasil, que não chegaram a ser usadas e foram atafulhadas com lençóis, colchas, cobertores e naftalina, até hoje guardam o nosso enxoval. Também nós, filhos de emigrante, estivemos para emigrar.
Refugiados e emigrantes. A história repete-se.
Há sempre um país em guerra; há sempre uma revolta ou uma revolução; há sempre alguém à procura de uma vida melhor para si e para os seus. E é preciso acreditar na compreensão, na solidariedade e na bondade humana para que todos tenham a oportunidade de recomeçar.
BW
quinta-feira, 16 de julho de 2015
Professora condenada por culpa dos alunos, pais e ministério
A falta de distanciamento e de discernimento das pessoas que exercem a
profissão docente causa-me perplexidade e muita preocupação.
Uma professora foi condenada a seis anos de prisão efectiva e a 18 mil euros de indemnização por agressões e maus tratos a uma turma de crianças de seis anos, do 1.º ano. A professora considerou-se inocente e negou os factos, mas os juízes ouviram as crianças e decidiram a pena, uma das razões foi a arguida não mostrar arrependimento. O PÚBLICO foi ler o acordo.
O que a docente fez às crianças vai marcá-las para a vida. Para a vida, repito. E o tribunal também não tem dúvidas disso: "Acresce que os maus tratos contra alunos muito novos não raras vezes acabam por redundar em insucesso escolar e exclusão social, que urge prevenir."
A escola fica na Amadora e na televisão vejo as mães das crianças, são de origem africana. São os mais pobres, aqueles para os quais queremos que a escola seja uma saída para uma vida melhor. Como, se aos seis anos, levam com uma professora que os agride, que atira com a cabeça dos meninos contra o quadro, se lhes bate com o livro de ponto, com um pau de vassoura e atira cadeiras pelo ar?
E o que leio nas redes sociais?
Pessoas a quem reconheço bom senso dizerem coisas como:
"Isto levava-nos a um enorme debate sobre as condições de trabalho que existem actualmente."
Lamento, mas neste caso não se trata de falta de condições de trabalho. Segundo o acordo, a mulher ter-se-á separado do marido, na mesma altura em que o pai morreu. E estes acontecimento podem mitigar "ligeiramente" a culpa da arguida, refere o tribunal. Portanto, estamos a falar do estado de saúde da docente.
Num grupo de professores no Facebook, onde a notícia foi partilhada, os profissionais insurgem-se contra os pais e contra os alunos. Há uma docente que conta que conhece uma educadora de infância que desistiu da profissão porque era agredida por crianças de 3, 4 e 5 anos. A sério? Então estava na profissão errada.
Por muito desestabilizadas que estejam as crianças – porque podem viver no seio de famílias desequilibradas –, o funcionamento do pré-escolar, as actividades, os trabalhos preparados para elas ajudam-nas a ganhar rotinas, a acalmar, a estabilizar, a ter regras.
Quantos destes meninos – que chegam ao jardim de infância com fome, que não vêem o pai porque está emigrado ou a mãe porque saiu às cinco da manhã para as limpezas, ou que são vítimas de violência doméstica –, é no jardim de infância que encontram estabilidade no sorriso da sua educadora e no acompanhamento da auxiliar?
Ah, mas a escola não tem de substituir a família, dir-me-ão. Eu sei, mas também não tem de dar cabo das crianças só porque estas não têm famílias estruturadas. Tem sim de contribuir para o esbatimento das desigualdades. Estes meninos dão mais trabalho? Dão. Mas se a escola tiver esse trabalho quando eles têm três anos, será mais fácil para as colegas do 1.º ciclo. E se estas fizerem o seu trabalho, estes meninos chegarão com melhores ferramentas ao 2.º ciclo. E se... é um ciclo e, quando chegarem à adolescência será mais difícil que se tornem marginais. É este que deve ser um dos contributos da escola para uma sociedade melhor.
Gosto do docente que diz que a pena é severa porque há quem mate e tenha penas menores. Ou do outro que compara a pena à de Manuel Palito que matou duas mulheres, 25 anos. A da docente é, claramente mais dura, diz. Ou do outro que se insurge porque a justiça foi célere. Mas essa é uma boa notícia! Ou do outro que pede mais autoridade para os professores. Para quê? Para dar cargas de porrada aos meninos a partir dos 3 anos porque chegam mal educados à escola? Para os atirar contra o quadro? Para os espancar com paus de vassoura? Mas não é possível impor a autoridade com palavras? É que eu conheço muitos professores que conseguem ser respeitados em turmas que outros apelidam de difíceis – portanto, a questão não está em ter mais autoridade, mas em saber exercê-la. No fundo, em saber ser professor.
"Não lhes devia bater, como muitas vezes batem certos pais, disso tenho quase a certeza, mas aos pais tudo é permitido, como seja donos de um objeto, e vingam-se muitas vezes nos professores porque já não têm para onde se virar e o professor neste momento é o elo mais fraco, por isso toca a andar... e aproveitar descarregar as mágoas de uma sociedade contaminada, egoísta e sem valores, enfim..."
Mas os professores não vivem nesta "sociedade contaminada, egoísta e sem valores"? Não podem contribuir para que esta tenha mais valores? Os professores sabem mais de educação e de pedagogia do que sabem os pais. Pelo menos aprenderam esses conceitos quando andavam a estudar e não podem aplicar o que aprenderam? E porque os pais batem, o acto da professora já não é tão grave? Mas o pior de tudo não é baterem nos filhos, é vingarem-se nos professores, o elo mais fraco. Pobre professora que, de certeza, por culpa dos pais, porque aqueles lhe azucrinavam a cabeça, batia nas crianças. Pobre professora que era o adulto na sala de aula, com duas dezenas de anos em cada mão as atirava contra a cara desses animais de seis anos. Não por vingança, isso não. Por ser uma pedagoga, claro. Para exercer a sua autoridade, para ensinar.
"Só os piores criminosos são condenados a tqnto tempo e mesmo assim só quando não têm dinheiro para corromper a justiça ou cunhas que os salvem! Agora esta professora, talvez culpada, é das piores criminosas do país! Qualquer dia os professores começam a sofrer chantagens de alunos e pais a dizer que os acusam de agressão e vão para a cadeia se não fizerem o que eles querem. Vai por um bonito caminho isto!"
Vai por um "bonito caminho" enquanto os professores olharem para os alunos e para os pais como olham. Vai por um "bonito caminho" por acharem que os colegas devem ser perdoados pelas circunstâncias. Porque morreu a mãe, porque se divorciou, porque se lhe furou um pneu, porque não sabe dar aulas, porque tem uma unha encravada, porque está com o período, porque, porque...
"Para quando penas idênticas para pais e alunos que insultam, ameaçam e agridem professores? Tenho muitas reservas quanto à forma como estes factos foram comprovados. Se a denuncia foi feita por uma colega, é ainda mais grave. Se achava que a colega não estava bem deveria ter agido de forma positiva. Podiam ter-lhe retirado a turma coloca-la na biblioteca ou nos apoios. Isto não a vai ajudar em nada!"
Há pais que são condenados. Há alunos que são condenados e expulsos do sistema. Quer os pais quer os alunos fazem capa no Correio da Manhã, como esta professora. É só procurar.
Este tipo de argumento da gravidade da colega ter denunciado a outra colega leva-me a questionar: Quantas situações não se passarão dentro das salas de aula que o corpo docente da escola tem conhecimento, mas não denuncia para não prejudicar o colega que, coitado, tem tantos problemas na vida, está deprimido, tem dívidas e não sabe como pagá-las, tem um filho que anda na droga ou um marido que lhe bate... Quantas direcções sabem e nada fazem? Como neste caso, em que o então director do agrupamento ouviu queixas durante cinco meses, cinco, e nada fez. Foi objecto de processo disciplinar.
Mas, para o colega há desculpa, toda a compreensão. Para os pais não. Esses têm de entregar à escola filhos perfeitos e prontos a ensinar. Entregá-los a pessoas que estão doentes mas que serão protegidas pelas outras que, aparentemente, não estão e apoiam a doente. Estas são as pessoas que "agem de forma positiva", esquecendo que a sua função na escola não é proteger colegas descompensados, mas proteger os alunos desses colegas. Porque não há professores sem alunos. Esquecem-se tantas vezes disto... Que existem para ensinar e não para se andarem a proteger uns aos outros e a empurrarem para as bibliotecas e para os apoios as maluquinhas... Ver se eu percebo: um murro na biblioteca tem menos impacto do que um na sala de aula? Já sei! Na biblioteca haverá menos testemunhas, logo, será mais fácil de desmentir. OK.
Há uma docente que vai ao ponto:
"Se ameaçarem de morte um filho nosso, ou se o espancarem devemos ser benevolentes só porque é um colega?"
Mas é logo atirada ao tapete por outra:
"Não! É partir-lhe logo ali a cara, apedrejá-lo, julgá-lo sem dó nem piedade e fazer como nos países pouco civilizados! Julgamento sem possibilidade de defesa e se a professora não assumir uma culpa que não tem e não mostrar arrependimento por não ter assumido uma culpa que não tem ainda temos as chicotadas no poste! Ou então podemos tentar averiguar o que se passou realmente e não fazer disto um estandarte do MEC!!"
Lá está: depois dos alunos mal comportados e dos pais que não sabem educar, faltava o ministério. A culpa é da tutela! Do MEC que não dá condições de trabalho aos professores e, ainda por cima, lança-lhes processos disciplinares quando tem suspeitas de que agiram mal. Maldito ministério...
E regressamos ao princípio: a culpa é de todos. Todos, excepto da professora que o tribunal condenou por dar como provados os crimes. Em nenhum momento a culpa pode ser da professora. Nenhum.
BW
Uma professora foi condenada a seis anos de prisão efectiva e a 18 mil euros de indemnização por agressões e maus tratos a uma turma de crianças de seis anos, do 1.º ano. A professora considerou-se inocente e negou os factos, mas os juízes ouviram as crianças e decidiram a pena, uma das razões foi a arguida não mostrar arrependimento. O PÚBLICO foi ler o acordo.
O que a docente fez às crianças vai marcá-las para a vida. Para a vida, repito. E o tribunal também não tem dúvidas disso: "Acresce que os maus tratos contra alunos muito novos não raras vezes acabam por redundar em insucesso escolar e exclusão social, que urge prevenir."
A escola fica na Amadora e na televisão vejo as mães das crianças, são de origem africana. São os mais pobres, aqueles para os quais queremos que a escola seja uma saída para uma vida melhor. Como, se aos seis anos, levam com uma professora que os agride, que atira com a cabeça dos meninos contra o quadro, se lhes bate com o livro de ponto, com um pau de vassoura e atira cadeiras pelo ar?
E o que leio nas redes sociais?
Pessoas a quem reconheço bom senso dizerem coisas como:
"Isto levava-nos a um enorme debate sobre as condições de trabalho que existem actualmente."
Lamento, mas neste caso não se trata de falta de condições de trabalho. Segundo o acordo, a mulher ter-se-á separado do marido, na mesma altura em que o pai morreu. E estes acontecimento podem mitigar "ligeiramente" a culpa da arguida, refere o tribunal. Portanto, estamos a falar do estado de saúde da docente.
Num grupo de professores no Facebook, onde a notícia foi partilhada, os profissionais insurgem-se contra os pais e contra os alunos. Há uma docente que conta que conhece uma educadora de infância que desistiu da profissão porque era agredida por crianças de 3, 4 e 5 anos. A sério? Então estava na profissão errada.
Por muito desestabilizadas que estejam as crianças – porque podem viver no seio de famílias desequilibradas –, o funcionamento do pré-escolar, as actividades, os trabalhos preparados para elas ajudam-nas a ganhar rotinas, a acalmar, a estabilizar, a ter regras.
Quantos destes meninos – que chegam ao jardim de infância com fome, que não vêem o pai porque está emigrado ou a mãe porque saiu às cinco da manhã para as limpezas, ou que são vítimas de violência doméstica –, é no jardim de infância que encontram estabilidade no sorriso da sua educadora e no acompanhamento da auxiliar?
Ah, mas a escola não tem de substituir a família, dir-me-ão. Eu sei, mas também não tem de dar cabo das crianças só porque estas não têm famílias estruturadas. Tem sim de contribuir para o esbatimento das desigualdades. Estes meninos dão mais trabalho? Dão. Mas se a escola tiver esse trabalho quando eles têm três anos, será mais fácil para as colegas do 1.º ciclo. E se estas fizerem o seu trabalho, estes meninos chegarão com melhores ferramentas ao 2.º ciclo. E se... é um ciclo e, quando chegarem à adolescência será mais difícil que se tornem marginais. É este que deve ser um dos contributos da escola para uma sociedade melhor.
Gosto do docente que diz que a pena é severa porque há quem mate e tenha penas menores. Ou do outro que compara a pena à de Manuel Palito que matou duas mulheres, 25 anos. A da docente é, claramente mais dura, diz. Ou do outro que se insurge porque a justiça foi célere. Mas essa é uma boa notícia! Ou do outro que pede mais autoridade para os professores. Para quê? Para dar cargas de porrada aos meninos a partir dos 3 anos porque chegam mal educados à escola? Para os atirar contra o quadro? Para os espancar com paus de vassoura? Mas não é possível impor a autoridade com palavras? É que eu conheço muitos professores que conseguem ser respeitados em turmas que outros apelidam de difíceis – portanto, a questão não está em ter mais autoridade, mas em saber exercê-la. No fundo, em saber ser professor.
"Não lhes devia bater, como muitas vezes batem certos pais, disso tenho quase a certeza, mas aos pais tudo é permitido, como seja donos de um objeto, e vingam-se muitas vezes nos professores porque já não têm para onde se virar e o professor neste momento é o elo mais fraco, por isso toca a andar... e aproveitar descarregar as mágoas de uma sociedade contaminada, egoísta e sem valores, enfim..."
Mas os professores não vivem nesta "sociedade contaminada, egoísta e sem valores"? Não podem contribuir para que esta tenha mais valores? Os professores sabem mais de educação e de pedagogia do que sabem os pais. Pelo menos aprenderam esses conceitos quando andavam a estudar e não podem aplicar o que aprenderam? E porque os pais batem, o acto da professora já não é tão grave? Mas o pior de tudo não é baterem nos filhos, é vingarem-se nos professores, o elo mais fraco. Pobre professora que, de certeza, por culpa dos pais, porque aqueles lhe azucrinavam a cabeça, batia nas crianças. Pobre professora que era o adulto na sala de aula, com duas dezenas de anos em cada mão as atirava contra a cara desses animais de seis anos. Não por vingança, isso não. Por ser uma pedagoga, claro. Para exercer a sua autoridade, para ensinar.
"Só os piores criminosos são condenados a tqnto tempo e mesmo assim só quando não têm dinheiro para corromper a justiça ou cunhas que os salvem! Agora esta professora, talvez culpada, é das piores criminosas do país! Qualquer dia os professores começam a sofrer chantagens de alunos e pais a dizer que os acusam de agressão e vão para a cadeia se não fizerem o que eles querem. Vai por um bonito caminho isto!"
Vai por um "bonito caminho" enquanto os professores olharem para os alunos e para os pais como olham. Vai por um "bonito caminho" por acharem que os colegas devem ser perdoados pelas circunstâncias. Porque morreu a mãe, porque se divorciou, porque se lhe furou um pneu, porque não sabe dar aulas, porque tem uma unha encravada, porque está com o período, porque, porque...
"Para quando penas idênticas para pais e alunos que insultam, ameaçam e agridem professores? Tenho muitas reservas quanto à forma como estes factos foram comprovados. Se a denuncia foi feita por uma colega, é ainda mais grave. Se achava que a colega não estava bem deveria ter agido de forma positiva. Podiam ter-lhe retirado a turma coloca-la na biblioteca ou nos apoios. Isto não a vai ajudar em nada!"
Há pais que são condenados. Há alunos que são condenados e expulsos do sistema. Quer os pais quer os alunos fazem capa no Correio da Manhã, como esta professora. É só procurar.
Este tipo de argumento da gravidade da colega ter denunciado a outra colega leva-me a questionar: Quantas situações não se passarão dentro das salas de aula que o corpo docente da escola tem conhecimento, mas não denuncia para não prejudicar o colega que, coitado, tem tantos problemas na vida, está deprimido, tem dívidas e não sabe como pagá-las, tem um filho que anda na droga ou um marido que lhe bate... Quantas direcções sabem e nada fazem? Como neste caso, em que o então director do agrupamento ouviu queixas durante cinco meses, cinco, e nada fez. Foi objecto de processo disciplinar.
Mas, para o colega há desculpa, toda a compreensão. Para os pais não. Esses têm de entregar à escola filhos perfeitos e prontos a ensinar. Entregá-los a pessoas que estão doentes mas que serão protegidas pelas outras que, aparentemente, não estão e apoiam a doente. Estas são as pessoas que "agem de forma positiva", esquecendo que a sua função na escola não é proteger colegas descompensados, mas proteger os alunos desses colegas. Porque não há professores sem alunos. Esquecem-se tantas vezes disto... Que existem para ensinar e não para se andarem a proteger uns aos outros e a empurrarem para as bibliotecas e para os apoios as maluquinhas... Ver se eu percebo: um murro na biblioteca tem menos impacto do que um na sala de aula? Já sei! Na biblioteca haverá menos testemunhas, logo, será mais fácil de desmentir. OK.
Há uma docente que vai ao ponto:
"Se ameaçarem de morte um filho nosso, ou se o espancarem devemos ser benevolentes só porque é um colega?"
Mas é logo atirada ao tapete por outra:
"Não! É partir-lhe logo ali a cara, apedrejá-lo, julgá-lo sem dó nem piedade e fazer como nos países pouco civilizados! Julgamento sem possibilidade de defesa e se a professora não assumir uma culpa que não tem e não mostrar arrependimento por não ter assumido uma culpa que não tem ainda temos as chicotadas no poste! Ou então podemos tentar averiguar o que se passou realmente e não fazer disto um estandarte do MEC!!"
Lá está: depois dos alunos mal comportados e dos pais que não sabem educar, faltava o ministério. A culpa é da tutela! Do MEC que não dá condições de trabalho aos professores e, ainda por cima, lança-lhes processos disciplinares quando tem suspeitas de que agiram mal. Maldito ministério...
E regressamos ao princípio: a culpa é de todos. Todos, excepto da professora que o tribunal condenou por dar como provados os crimes. Em nenhum momento a culpa pode ser da professora. Nenhum.
BW
domingo, 28 de junho de 2015
Os professores e a mania da perseguição
A notícia é clara e, aparentemente, não suscita dúvidas: os professores correctores não receberam formação este ano para corrigir os exames. Mais: quase metade desses docentes não tem qualquer formação.
A culpa é dos professores? Não. A culpa é do agora independente Instituto de Avaliação Externa (IAVE).
Mas quem passar pela caixa dos comentários do PÚBLICO ou pelo Facebook os comentários é de quem está sempre de pé atrás, de quem pensa que as notícias se escrevem para denegrir os professores, de quem acha que está a ser perseguido, de quem tem certezas absolutas sobre o seu profissionalismo e que este está a ser posto em causa...
Calma, senhores professores... A culpa de não haver formação não é vossa, a culpa – como disse no parágrafo anterior – é do IAVE.
E agora, sejamos sinceros, acreditam mesmo que como avaliam ao longo do ano, ao longo de todos os anos da vossa carreira, também sabem avaliar os exames nacionais? Não sabem... Não sabem porque não é fácil, se fosse, nem era preciso o IAVE fazer critérios, pois os senhores professores com a vossa experiência não precisariam de critérios. Não é fácil, se fosse os professores que conheço e que estão a corrigir seriamente os exames não me confessavam que este ano está a ser uma "confusão", uma "barraca", uma "bagunça".
Portanto, as notícias não se fazem contra os professores, fazem-se para informar os leitores. É importante que a comunidade educativa saiba o que se passa. É importante que o país conheça em que condições foram feitos estes exames. Neste caso, até se fazem as notícias para as usarem em vossa defesa. Se corrigirem tudo mal, se houver muitos pedidos de revisão, se muitas notas forem alteradas, podem sempre dizer do alto do vosso profissionalismo: a culpa é do IAVE, eu bem queria fazer formação, mas não havia...
Agora não digam, como alguns escrevem, que são tão bons, tão bons, mas tão bons que nem precisam de formação. Aprender até morrer e morrer sem saber, dizia a criada de casa da minha avó ou como diria Sócrates, o filósofo, "Eu só sei que nada sei". Mas digam-no batendo no peito, num acto de contrição e acreditem que o mundo não está todo contra vós. Não está.
BW
A culpa é dos professores? Não. A culpa é do agora independente Instituto de Avaliação Externa (IAVE).
Mas quem passar pela caixa dos comentários do PÚBLICO ou pelo Facebook os comentários é de quem está sempre de pé atrás, de quem pensa que as notícias se escrevem para denegrir os professores, de quem acha que está a ser perseguido, de quem tem certezas absolutas sobre o seu profissionalismo e que este está a ser posto em causa...
Calma, senhores professores... A culpa de não haver formação não é vossa, a culpa – como disse no parágrafo anterior – é do IAVE.
E agora, sejamos sinceros, acreditam mesmo que como avaliam ao longo do ano, ao longo de todos os anos da vossa carreira, também sabem avaliar os exames nacionais? Não sabem... Não sabem porque não é fácil, se fosse, nem era preciso o IAVE fazer critérios, pois os senhores professores com a vossa experiência não precisariam de critérios. Não é fácil, se fosse os professores que conheço e que estão a corrigir seriamente os exames não me confessavam que este ano está a ser uma "confusão", uma "barraca", uma "bagunça".
Portanto, as notícias não se fazem contra os professores, fazem-se para informar os leitores. É importante que a comunidade educativa saiba o que se passa. É importante que o país conheça em que condições foram feitos estes exames. Neste caso, até se fazem as notícias para as usarem em vossa defesa. Se corrigirem tudo mal, se houver muitos pedidos de revisão, se muitas notas forem alteradas, podem sempre dizer do alto do vosso profissionalismo: a culpa é do IAVE, eu bem queria fazer formação, mas não havia...
Agora não digam, como alguns escrevem, que são tão bons, tão bons, mas tão bons que nem precisam de formação. Aprender até morrer e morrer sem saber, dizia a criada de casa da minha avó ou como diria Sócrates, o filósofo, "Eu só sei que nada sei". Mas digam-no batendo no peito, num acto de contrição e acreditem que o mundo não está todo contra vós. Não está.
BW
quinta-feira, 18 de junho de 2015
Mas alguém viu o exame de Português com olhos de ver?
Mas o que é que se passou com o exame de Português? E o que é que se passa com as associações de professores de Português? (sim, "associações" no plural, pois vivemos num país em que cada vez mais, em vez de consensos, se criam divisões). E, se esperávamos sensatez nos comentários de uma associação, espantamo-nos quando não nos revemos nas opiniões publicadas nos jornais de nenhuma das duas representantes dos professores de português.
Ora recordemos este exame.
Matéria do 12.º ano: excerto de "Memorial do Convento" - perguntas de interpretação, que não apelam ao conhecimento da obra, autor ou estilo.
Matéria do 10.º e 11.º: poema de Sophia (tema - poesia contemporânea do 10.º ano) - perguntas de interpretação, que não apelam ao conhecimento da obra, autor ou estilo.
Gramática e interpretação: um belíssimo texto de Tolentino Mendonça - 50 pontos, dos quais apenas 20 eram para gramática, os restantes eram de interpretação.
O Público ouviu as duas associações de Português. E, mais uma vez, estas divergiram.
A APP crê que as médias vão voltar a baixar porque duas perguntas "exigiam uma grande concentração da parte dos alunos" . Porque exigia concentração?!? (Vá lá, refere-se a falta de objectividade do exame. Mas já lá irei.)
A nova Associação Nacional de Professores de Português considera que a prova foi “bastante acessível e absolutamente exequível para qualquer aluno”. Ok. Mas não comenta a articulação com o programa?
Moral da história: alguém viu o exame de Português com olhos de ver? Ouviram os alunos no final da prova? Sentiram o descrédito que a mesma gerou em torno da disciplina de Português, disciplina já tão mal amada e tratada?
Ninguém é capaz de dizer que esta prova gorou por completo as expectativas dos alunos que estudaram a sério autores e obras referentes aos três anos da disciplina? Ninguém é capaz de dizer que para o exame não era preciso ter estudado os peixes todos do Sermão de Santo António, o estilo queirosiano, "Os Lusíadas", "A Mensagem", a lírica de Camões, a peça "Felizmente Há Luar!"? Sim... estudar estas obras desenvolveu as competências necessárias à análise que se pedia no exame. Mas, por favor, não era precisa conhecer o romantismo, realismo, modernismo!
Os textos foram bem selecionados. Os autores são inquestionáveis. As perguntas interessantes e bem formuladas. Mas, definitivamente, os alunos [que estudaram, note-se] sentiram-se defraudados.
PS - falta referir uma novidade (boa) deste exame: acabaram-se as respostas de gramática cotadas com 0 pontos devido aos erros de ortografia ou acentuação.
Ora recordemos este exame.
Matéria do 12.º ano: excerto de "Memorial do Convento" - perguntas de interpretação, que não apelam ao conhecimento da obra, autor ou estilo.
Matéria do 10.º e 11.º: poema de Sophia (tema - poesia contemporânea do 10.º ano) - perguntas de interpretação, que não apelam ao conhecimento da obra, autor ou estilo.
Gramática e interpretação: um belíssimo texto de Tolentino Mendonça - 50 pontos, dos quais apenas 20 eram para gramática, os restantes eram de interpretação.
O Público ouviu as duas associações de Português. E, mais uma vez, estas divergiram.
A APP crê que as médias vão voltar a baixar porque duas perguntas "exigiam uma grande concentração da parte dos alunos" . Porque exigia concentração?!? (Vá lá, refere-se a falta de objectividade do exame. Mas já lá irei.)
A nova Associação Nacional de Professores de Português considera que a prova foi “bastante acessível e absolutamente exequível para qualquer aluno”. Ok. Mas não comenta a articulação com o programa?
Moral da história: alguém viu o exame de Português com olhos de ver? Ouviram os alunos no final da prova? Sentiram o descrédito que a mesma gerou em torno da disciplina de Português, disciplina já tão mal amada e tratada?
Ninguém é capaz de dizer que esta prova gorou por completo as expectativas dos alunos que estudaram a sério autores e obras referentes aos três anos da disciplina? Ninguém é capaz de dizer que para o exame não era preciso ter estudado os peixes todos do Sermão de Santo António, o estilo queirosiano, "Os Lusíadas", "A Mensagem", a lírica de Camões, a peça "Felizmente Há Luar!"? Sim... estudar estas obras desenvolveu as competências necessárias à análise que se pedia no exame. Mas, por favor, não era precisa conhecer o romantismo, realismo, modernismo!
Os textos foram bem selecionados. Os autores são inquestionáveis. As perguntas interessantes e bem formuladas. Mas, definitivamente, os alunos [que estudaram, note-se] sentiram-se defraudados.
PS - falta referir uma novidade (boa) deste exame: acabaram-se as respostas de gramática cotadas com 0 pontos devido aos erros de ortografia ou acentuação.
terça-feira, 16 de junho de 2015
Os exames, os exames, os exames
Estou numa repartição pública e vejo o meu amigo Paulo Guinote na Opinião Pública da SIC Notícias. O tema são os exames. Vou sentar-me por baixo da televisão para ouvi-lo, não preciso de o ver! Em vez disso, ouço os telespectadores que ligam.
Uma avó que se queixa do dinheiro que os filhos gastam em explicações. Os netos não têm dificuldades, nem insucesso, "são só calões" – "é o que eu lhes digo!", reforça–, e levanta a questão primordial: o que estão a avaliar estes exames, o dinheiro que os pais gastam em explicações?
De seguida, entra uma senhora que começa por falar do acordo ortográfico. Desligo porque acabo de ser chamada e já não ouço o final. Volto a tomar atenção quando a funcionária vai fazer umas fotocópias e entra um estudante do secundário que não percebe a utilidade dos exames. Pois se ele fez dezenas de testes, ao longo do ano, entregou trabalhos escritos e apresentou outros orais, pois se ele se fartou de trabalhar por que razão tem de ser avaliado pelo que aprendeu em dois ou três anos de ensino em apenas duas horas, pergunta. São duas horas e meia, corrijo mentalmente. O miúdo confessa que, por vezes, tem vontade de chorar ou que chora, já não me recordo porque estou a pagar e a pensar "como o Estado me rouba, meu Deus!".
Atenta, a funcionária que me atende e que ainda não chegou aos 30 anos não resiste: "Diz que chora... deixá-los chegar à universidade para verem como elas doem!"
"Olhe que não, eles são muito pequenos e sentem uma pressão imensa. Eu não a senti na universidade", respondo-lhe, antes de me despedir. Eu sou do tempo da primeira PGA e aquela foi uma palhaçada.
E com isto, não ouço o que diz Guinote, acho que fala do negócio que gira em torno dos exames, não sei se já falou das explicações, mas ouço-o sobre os manuais escolares que se vendem nesta altura e que podem ser mais caros que os manuais, propriamente ditos, aqueles que se compram no início do ano lectivo. Saio que tenho mais uma burocracia para tratar.
Mas a pergunta que me fica é a da avó: o que estão a avaliar estes exames?
Estão a avaliar o que eles aprenderam ao longo de dois ou de três anos ou o que engoliram quais patos para o foie gras – dois ou três anos a ouvirem "olhem que isto pode sair no exame, olhem que isto é matéria de exame, calem-se senão não consigo dar-vos a matéria toda que vai sair no exame..."
Professores concentrados em preparar para o exame, em vez de ensinar, de fundamentar, de experimentar aquilo que se transmite. Professores atrapalhados porque não deram a matéria toda, aquela que vem para o exame. Professores que consideram que as disciplinas de exame são mais importantes do que as outras. Por isso, deviam ter mais horas lectivas, por isso, as outras deviam ser anuladas do currículo.
Pais concentrados no sucesso dos filhos. Pais atrapalhados porque os meninos não sabem tudo, não estão preparados. Pais que consideram que as crianças têm de se aplicar nas disciplinas que vão a exame – como aquela mãe que não estava nada preocupada porque a professora do 1.º ciclo ainda não tinha dado, até Maio, altura dos exames do 4.º ano, nada de Estudo do Meio, mas em contrapartida os meninos estavam mais do que preparados para responderem a Português e a Matemática e deixarem o colégio no topo dos rankings porque o importante é vermos que gastamos bem o nosso dinheiro, numa escola de qualidade, que isso do Estudo do Meio não interessa nada!
Alunos concentrados em assimilar toda a matéria dos dois ou três anos que durou o secundário. Alunos atrapalhados porque ainda não sabem tudo, não conseguem fazer todos os exercícios e "se sai aquela matéria que eu sei menos bem?" Alunos que consideram, como o que ligou para a antena da SIC, que tudo isto é ridículo: como se pode avaliar em duas horas (e meia) o que se aprendeu em vários anos lectivos? Por quê dar tanta importância a uma avaliação externa? E contudo lá estão eles a trabalhar porque a nota do exame é importante e, alguns, choram.
BW
Uma avó que se queixa do dinheiro que os filhos gastam em explicações. Os netos não têm dificuldades, nem insucesso, "são só calões" – "é o que eu lhes digo!", reforça–, e levanta a questão primordial: o que estão a avaliar estes exames, o dinheiro que os pais gastam em explicações?
De seguida, entra uma senhora que começa por falar do acordo ortográfico. Desligo porque acabo de ser chamada e já não ouço o final. Volto a tomar atenção quando a funcionária vai fazer umas fotocópias e entra um estudante do secundário que não percebe a utilidade dos exames. Pois se ele fez dezenas de testes, ao longo do ano, entregou trabalhos escritos e apresentou outros orais, pois se ele se fartou de trabalhar por que razão tem de ser avaliado pelo que aprendeu em dois ou três anos de ensino em apenas duas horas, pergunta. São duas horas e meia, corrijo mentalmente. O miúdo confessa que, por vezes, tem vontade de chorar ou que chora, já não me recordo porque estou a pagar e a pensar "como o Estado me rouba, meu Deus!".
Atenta, a funcionária que me atende e que ainda não chegou aos 30 anos não resiste: "Diz que chora... deixá-los chegar à universidade para verem como elas doem!"
"Olhe que não, eles são muito pequenos e sentem uma pressão imensa. Eu não a senti na universidade", respondo-lhe, antes de me despedir. Eu sou do tempo da primeira PGA e aquela foi uma palhaçada.
E com isto, não ouço o que diz Guinote, acho que fala do negócio que gira em torno dos exames, não sei se já falou das explicações, mas ouço-o sobre os manuais escolares que se vendem nesta altura e que podem ser mais caros que os manuais, propriamente ditos, aqueles que se compram no início do ano lectivo. Saio que tenho mais uma burocracia para tratar.
Mas a pergunta que me fica é a da avó: o que estão a avaliar estes exames?
Estão a avaliar o que eles aprenderam ao longo de dois ou de três anos ou o que engoliram quais patos para o foie gras – dois ou três anos a ouvirem "olhem que isto pode sair no exame, olhem que isto é matéria de exame, calem-se senão não consigo dar-vos a matéria toda que vai sair no exame..."
Professores concentrados em preparar para o exame, em vez de ensinar, de fundamentar, de experimentar aquilo que se transmite. Professores atrapalhados porque não deram a matéria toda, aquela que vem para o exame. Professores que consideram que as disciplinas de exame são mais importantes do que as outras. Por isso, deviam ter mais horas lectivas, por isso, as outras deviam ser anuladas do currículo.
Pais concentrados no sucesso dos filhos. Pais atrapalhados porque os meninos não sabem tudo, não estão preparados. Pais que consideram que as crianças têm de se aplicar nas disciplinas que vão a exame – como aquela mãe que não estava nada preocupada porque a professora do 1.º ciclo ainda não tinha dado, até Maio, altura dos exames do 4.º ano, nada de Estudo do Meio, mas em contrapartida os meninos estavam mais do que preparados para responderem a Português e a Matemática e deixarem o colégio no topo dos rankings porque o importante é vermos que gastamos bem o nosso dinheiro, numa escola de qualidade, que isso do Estudo do Meio não interessa nada!
Alunos concentrados em assimilar toda a matéria dos dois ou três anos que durou o secundário. Alunos atrapalhados porque ainda não sabem tudo, não conseguem fazer todos os exercícios e "se sai aquela matéria que eu sei menos bem?" Alunos que consideram, como o que ligou para a antena da SIC, que tudo isto é ridículo: como se pode avaliar em duas horas (e meia) o que se aprendeu em vários anos lectivos? Por quê dar tanta importância a uma avaliação externa? E contudo lá estão eles a trabalhar porque a nota do exame é importante e, alguns, choram.
BW
quinta-feira, 4 de junho de 2015
O ensino do latim e do grego
"Sabiam que "Nike", a marca das sapatilhas, em grego se diz "Niquê" e que este é o nome da deusa da Vitória? Em que é que pensaram os senhores que criaram esta marca?"
Esta é uma das perguntas que fazemos, eu e a Ana, quando apresentamos a colecção Olimpvs.net nas escolas.
A mitologia e a cultura greco-romana estão na génese da nossa história, da nossa cultura, da ciência, de tudo o que nos rodeia. É isto que procuramos transmitir e eles, entre os 9 e os 15 anos, ficam deslumbrados – um animal mítico (que está na capa do quarto volume) que dá nome a um órgão que temos no cérebro?! É o hipotálamo.
O grego e o latim vão regressar. Com um ministério liderado por Nuno Crato, outra coisa não seria de esperar. O latim é obrigatório nos currículos norte-americanos e os alunos consideram que este é fundamental para compreenderem a Biologia, as ciências exactas em geral. Não me parece mal. São as nossas origens, como dizia.
As questões que se põem são: existem professores para o Latim e o Grego? Existem pais sensibilizados? E alunos? Não haverá áreas mais relevantes, áreas que foram tiradas às escolas, que são mais pertinentes de serem trabalhadas?
A esta última pergunta, eu diria que sim: primeiro é preciso saber sentá-los; depois, poderemos todos alegrar-nos com o regresso do latim e do grego.
BW
Esta é uma das perguntas que fazemos, eu e a Ana, quando apresentamos a colecção Olimpvs.net nas escolas.
A mitologia e a cultura greco-romana estão na génese da nossa história, da nossa cultura, da ciência, de tudo o que nos rodeia. É isto que procuramos transmitir e eles, entre os 9 e os 15 anos, ficam deslumbrados – um animal mítico (que está na capa do quarto volume) que dá nome a um órgão que temos no cérebro?! É o hipotálamo.
O grego e o latim vão regressar. Com um ministério liderado por Nuno Crato, outra coisa não seria de esperar. O latim é obrigatório nos currículos norte-americanos e os alunos consideram que este é fundamental para compreenderem a Biologia, as ciências exactas em geral. Não me parece mal. São as nossas origens, como dizia.
As questões que se põem são: existem professores para o Latim e o Grego? Existem pais sensibilizados? E alunos? Não haverá áreas mais relevantes, áreas que foram tiradas às escolas, que são mais pertinentes de serem trabalhadas?
A esta última pergunta, eu diria que sim: primeiro é preciso saber sentá-los; depois, poderemos todos alegrar-nos com o regresso do latim e do grego.
BW
quarta-feira, 3 de junho de 2015
Parece que a violência no namoro é normal...
No pátio, ele aparece por detrás dela, aperta-lhe o pescoço e pendura-se. A rapariga desequilibra-se, dá um grito de surpresa e de dor. Ele larga-a e ri-se. "'Tás parvo?!", atira-lhe ela. "Estava a gozar...", responde o rapaz, 17 anos, sorrindo, mas rapidamente o rosto se fecha e acrescenta: "Mas eu vi que estavas a olhar para aquele." Ela ainda tem a mão esquerda a massajar o pescoço quando atira a direita contra a cara do rapaz, com força, esbofeteando-o. "És mesmo parvo."
No que resta do intervalo, os dois não se falam, nem se olham. Mas no intervalo seguinte já estão juntos, como se nada se tivesse passado. Ele já lhe fez várias cenas de ciúme, mas ela gosta dele, o que é que se há-de fazer? "Não é por mal, gosta de mim..."
Um em cada quatro jovens acredita que a violência no namoro é normal, revela um inquérito da UMAR. Em Abril, um relatório da PSP revelava que de 2013 para 2014, as queixas por violência no namoro aumentaram 50%, a PSP passou a receber mais de quatro queixas por dia. Porque a violência no namoro existe, o Governo lançou, em Fevereiro, uma campanha chamada "Quem te ama não te agride" e tem uma frase fundamental, que resume tudo o que os miúdos deviam saber sobre o tema: "Se alguém te agride, se alguém te humilha, se alguém te controla, se alguém te isola dos amigos, isso não é amor, é violência."
Confesso que tenho sempre expectativas altas para os mais novos e que ler notícias sobre estudos e observar cenas de violência entre jovens me deixam angustiada. Se no namoro é assim, o que esperam no casamento? Que falta de auto-estima é essa, que permite que se deixem humilhar e maltratar? Que exemplos têm em casa para que se deixem controlar e agredir? A família não educa para o namoro, para as relações sexuais, para o amor? Espera que seja a escola, a televisão, os amigos a fazê-lo?
Deixo outra frase que espelha o que devem ser as relações, da mãe de Miguel Esteves Cardoso, e que está hoje na sua crónica no PÚBLICO:
"Quando um homem adora uma mulher, ele quer que ela seja feliz, e ela não precisa de lutar por nada. Ele coloca tudo a seus pés – e é um homem feliz por fazê-lo.", Diana Esteves Cardoso
É deste amor que pais e filhos devem falar: o do respeito, o da dignidade, o que faz feliz.
BW
No que resta do intervalo, os dois não se falam, nem se olham. Mas no intervalo seguinte já estão juntos, como se nada se tivesse passado. Ele já lhe fez várias cenas de ciúme, mas ela gosta dele, o que é que se há-de fazer? "Não é por mal, gosta de mim..."
Um em cada quatro jovens acredita que a violência no namoro é normal, revela um inquérito da UMAR. Em Abril, um relatório da PSP revelava que de 2013 para 2014, as queixas por violência no namoro aumentaram 50%, a PSP passou a receber mais de quatro queixas por dia. Porque a violência no namoro existe, o Governo lançou, em Fevereiro, uma campanha chamada "Quem te ama não te agride" e tem uma frase fundamental, que resume tudo o que os miúdos deviam saber sobre o tema: "Se alguém te agride, se alguém te humilha, se alguém te controla, se alguém te isola dos amigos, isso não é amor, é violência."
Confesso que tenho sempre expectativas altas para os mais novos e que ler notícias sobre estudos e observar cenas de violência entre jovens me deixam angustiada. Se no namoro é assim, o que esperam no casamento? Que falta de auto-estima é essa, que permite que se deixem humilhar e maltratar? Que exemplos têm em casa para que se deixem controlar e agredir? A família não educa para o namoro, para as relações sexuais, para o amor? Espera que seja a escola, a televisão, os amigos a fazê-lo?
Deixo outra frase que espelha o que devem ser as relações, da mãe de Miguel Esteves Cardoso, e que está hoje na sua crónica no PÚBLICO:
"Quando um homem adora uma mulher, ele quer que ela seja feliz, e ela não precisa de lutar por nada. Ele coloca tudo a seus pés – e é um homem feliz por fazê-lo.", Diana Esteves Cardoso
É deste amor que pais e filhos devem falar: o do respeito, o da dignidade, o que faz feliz.
BW
terça-feira, 2 de junho de 2015
um alfarrabista dos tempos modernos
O OLX, passe a publicidade, foi sempre na minha cabeça para bicicletas, cadeirinhas e objectos afins. Pouco utilizadora destas plataformas, porque acabo sempre por dar a alguém conhecido o que sobra ou deixa de servir cá em casa, decidi espreitar o negócio dos livros, tentada por duas razões.
A primeira deve-se a uma aluna, numa escola onde eu e a Bárbara fomos falar que ficou tristíssima quando, depois de nos ouvir, percebeu como a coleção Olimpvs.net era fantástica e entusiasmante, e a sua mãe tinha colocado à venda no OLX um dos livros da coleção que lhe tinham oferecido nos anos!
O segundo, quando quis dar a ler à minha filha os velhos livros da minha infância (Gémeas, Condessa de Ségur, etc.) e fiz contas ao valor da coleção. Claro que no "meu tempo", tal questão de custo não se colocava. Os livros eram requisitados na Biblioteca da F. C. Gulbenkian. Nunca eu tive tantos livros como os meus filhos têm a sorte de ter. Já lhes disse! Mas termino aqui o parêntesis com a crise dos livros nas bibliotecas modernas. Levei a minha filha à nossa Biblioteca, procurando que ela seguisse os meus conselhos: - "Requisitas, com o teu novo cartão de sócia!". Desilusão. A biblioteca só tem até ao volume 3. Exatamente aquele que ela também já leu. Pergunto, então, a uma amiga se os tem. Diz que não e responde-me: - Agora só compro livros no OLX.
Era a segunda vez que ouvia na mesma frase «livros» e «OLX». Pois lá fiz uma pesquisa. O livro que a mãe da tal leitora Olimpvs colocara à venda já lá não estava. (Ou foi vendido, ou a garota conseguiu ficar com ele e lê-lo.) Quanto à condessa de Ségur e E. Blyton, abundam livros, coleções, uns de ponta dobrada e folhas amarelecidas, outros estimados, outros de 1973, enfim...
Quem diria. Acabei de descobrir um alfarrabista dos tempos modernos! Falta-lhe o cheiro, toque, pó e magia dos alfarrabistas. Mas os livros, esses, estão lá também!
A primeira deve-se a uma aluna, numa escola onde eu e a Bárbara fomos falar que ficou tristíssima quando, depois de nos ouvir, percebeu como a coleção Olimpvs.net era fantástica e entusiasmante, e a sua mãe tinha colocado à venda no OLX um dos livros da coleção que lhe tinham oferecido nos anos!
O segundo, quando quis dar a ler à minha filha os velhos livros da minha infância (Gémeas, Condessa de Ségur, etc.) e fiz contas ao valor da coleção. Claro que no "meu tempo", tal questão de custo não se colocava. Os livros eram requisitados na Biblioteca da F. C. Gulbenkian. Nunca eu tive tantos livros como os meus filhos têm a sorte de ter. Já lhes disse! Mas termino aqui o parêntesis com a crise dos livros nas bibliotecas modernas. Levei a minha filha à nossa Biblioteca, procurando que ela seguisse os meus conselhos: - "Requisitas, com o teu novo cartão de sócia!". Desilusão. A biblioteca só tem até ao volume 3. Exatamente aquele que ela também já leu. Pergunto, então, a uma amiga se os tem. Diz que não e responde-me: - Agora só compro livros no OLX.
Era a segunda vez que ouvia na mesma frase «livros» e «OLX». Pois lá fiz uma pesquisa. O livro que a mãe da tal leitora Olimpvs colocara à venda já lá não estava. (Ou foi vendido, ou a garota conseguiu ficar com ele e lê-lo.) Quanto à condessa de Ségur e E. Blyton, abundam livros, coleções, uns de ponta dobrada e folhas amarelecidas, outros estimados, outros de 1973, enfim...
Quem diria. Acabei de descobrir um alfarrabista dos tempos modernos! Falta-lhe o cheiro, toque, pó e magia dos alfarrabistas. Mas os livros, esses, estão lá também!
segunda-feira, 1 de junho de 2015
No Dia da Criança não lhe dê um tablet
O bebé, talvez tenha um ano, está a dormitar no carrinho, enquanto os pais assistem à missa da Primeira Comunhão do irmão mais velho. Com o barulho conjunto de toda a comunidade a levantar-se, o bebé abre os olhos, ainda estremunhado é presenteado com um smartphone. O bebé agarra-o e começa a brincar.
Onde estão os bonequinhos de pano, aqueles da Cristina Siopa? Rocas não pode ser porque fazem barulho, mas um bonequinho ou um livro maleável para aprender a mudar as páginas, para descobrir os animais... Não, toma lá um smartphone e sossegadito!
Há uns tempos vi um vídeo, daqueles virais, que mostrava uma menina com pouco mais de ano e meio a tentar mudar as páginas de algumas revistas como quem muda de ecrã no tablet. E lá estava ela de dedinho espetado a passar por cima das capas, mas a imagem não mudava.
Como é importante que eles saibam folhear um livro, fazê-lo da direita para a esquerda, compreender como se mudam as páginas, a lógica da leitura. Podem fazê-lo só quando chegarem ao pré-escolar, mas o ideal é que o saibam fazer antes de começarem a ir para o jardim-de-infância.
Como são importantes os livros, as histórias contadas antes de adormecer, as perguntas que eles fazem, os mimos... Lembro-me sempre do livro "Adivinha quanto eu gosto de ti", como é bom, ternurento, calmante depois de um dia de correrias e como ajuda a criar laços entre pais e filhos. Melhor que mil jogos no smartphone ou no tablet!
Ah, mas esta é uma geração diferente, muito mais informada e é isso que queremos para os nossos filhos, que sejam os 'mais qualquer coisa'!
Depois da primeira comunhão há festa e converso com um amigo, professor universitário, que se queixa da impreparação com que chegam ao 5.º ano do mestrado integrado. "Eles têm acesso a tudo mas não sabem ler, interpretar, pensar para além do que lêem. É tudo demasiado imediato e aparentemente fácil. E depois queixam-se 'ih... ó professor, mas está a pedir-nos para nos lembrarmos da matéria que demos no 2.º ano?...' querem que eu lhes faça a papinha toda, não pode ser."
O acesso imediato às novas tecnologias tem este lado negativo – já não há enciclopédias para consultar, livros para ler, existe o motor de busca e se não estiver lá é porque não existe –, mas há outros. E regressamos aos mais pequenos. Um tablet não substitui o manusear os blocos, as peças dos legos, os bonecos da playmobil, e, acima de tudo, não pode substituir a relação dos pais com os filhos.
Dá trabalho estar a brincar com eles? Dá trabalho ensinar as cores? Dá trabalho dizer que isto é um cubo e aquilo uma esfera? Não devia. A relação pais e filhos não deve dar trabalho, mas alegria, orgulho, felicidade.
É mais fácil pô-lo à frente da televisão a ver um programa pedagógico? É mais fácil pô-lo a ver um dvd? É mais fácil passar-lhe o telemóvel para a mão? É. Mas o que se perde na relação entre os pais e os filhos pode ser irrecuperável.
E depois eles chegam à escola completamente desaustinados porque a professora não tem lá um smartphone para cada um, para os entreter. E depois dizem que os meninos sofrem de hiperactividade, que não conseguem estar concentrados, défice de atenção. Sim, é isso mesmo, têm falta de atenção, falta de educação.
BW
Onde estão os bonequinhos de pano, aqueles da Cristina Siopa? Rocas não pode ser porque fazem barulho, mas um bonequinho ou um livro maleável para aprender a mudar as páginas, para descobrir os animais... Não, toma lá um smartphone e sossegadito!
Há uns tempos vi um vídeo, daqueles virais, que mostrava uma menina com pouco mais de ano e meio a tentar mudar as páginas de algumas revistas como quem muda de ecrã no tablet. E lá estava ela de dedinho espetado a passar por cima das capas, mas a imagem não mudava.
Como é importante que eles saibam folhear um livro, fazê-lo da direita para a esquerda, compreender como se mudam as páginas, a lógica da leitura. Podem fazê-lo só quando chegarem ao pré-escolar, mas o ideal é que o saibam fazer antes de começarem a ir para o jardim-de-infância.
Como são importantes os livros, as histórias contadas antes de adormecer, as perguntas que eles fazem, os mimos... Lembro-me sempre do livro "Adivinha quanto eu gosto de ti", como é bom, ternurento, calmante depois de um dia de correrias e como ajuda a criar laços entre pais e filhos. Melhor que mil jogos no smartphone ou no tablet!
Ah, mas esta é uma geração diferente, muito mais informada e é isso que queremos para os nossos filhos, que sejam os 'mais qualquer coisa'!
Depois da primeira comunhão há festa e converso com um amigo, professor universitário, que se queixa da impreparação com que chegam ao 5.º ano do mestrado integrado. "Eles têm acesso a tudo mas não sabem ler, interpretar, pensar para além do que lêem. É tudo demasiado imediato e aparentemente fácil. E depois queixam-se 'ih... ó professor, mas está a pedir-nos para nos lembrarmos da matéria que demos no 2.º ano?...' querem que eu lhes faça a papinha toda, não pode ser."
O acesso imediato às novas tecnologias tem este lado negativo – já não há enciclopédias para consultar, livros para ler, existe o motor de busca e se não estiver lá é porque não existe –, mas há outros. E regressamos aos mais pequenos. Um tablet não substitui o manusear os blocos, as peças dos legos, os bonecos da playmobil, e, acima de tudo, não pode substituir a relação dos pais com os filhos.
Dá trabalho estar a brincar com eles? Dá trabalho ensinar as cores? Dá trabalho dizer que isto é um cubo e aquilo uma esfera? Não devia. A relação pais e filhos não deve dar trabalho, mas alegria, orgulho, felicidade.
É mais fácil pô-lo à frente da televisão a ver um programa pedagógico? É mais fácil pô-lo a ver um dvd? É mais fácil passar-lhe o telemóvel para a mão? É. Mas o que se perde na relação entre os pais e os filhos pode ser irrecuperável.
E depois eles chegam à escola completamente desaustinados porque a professora não tem lá um smartphone para cada um, para os entreter. E depois dizem que os meninos sofrem de hiperactividade, que não conseguem estar concentrados, défice de atenção. Sim, é isso mesmo, têm falta de atenção, falta de educação.
BW
domingo, 31 de maio de 2015
A importância de saber falar e vestir
Chega o tempo quente e as roupas diminuem. A escola deve intervir neste tema, o do vestuário, pergunta um professor, na escola Inês de Castro em Gaia.
Há escolas que já o fazem, respondo. Não há calções, tops ou chinelos no interior do estabelecimento de ensino. Há escolas que vão mais longe, as privadas, que substituem a roupa do dia-a-dia por uniformes.
O uniforme é óptimo para as manhãs dos pais, só há aquilo para vestir por isso não há como discutir se a criança se demora muito a escolher a roupa ou a pedir-lhe para trocar os calções da praia pelas calças. O uniforme é óptimo para a escola, os seus alunos publicitam-na por onde passam – "Olha, aquele anda no... Olha, aquela é do..." O uniforme também pode ser bom para os alunos, andam todos de igual e ponto, não há marcas, não há roupas baratas ou caras.
Mas apesar de todos os aparentes benefícios do uniforme, prefiro que não o usem. Prefiro que sejam eles a escolhê-lo porque, a verdade, nas escolas onde o uniforme não é obrigatório, todos andam de uniforme, as roupas deles e delas são todas iguais, as marcas que privilegiam são as mesmas.
Deixá-los ter liberdade para as escolher desde que o façam connosco e aqui o papel dos pais é fundamental. Educá-los. Educá-los para saberem que não é apropriado usar uns calções de praia e uns chinelos para ir para a escola ou para a faculdade. Educá-los para saberem que "vestir bem" não é envergar uma roupa própria para ir a um casamento ou à discoteca.
Se há uns tempos não era preciso dizer isto a ninguém, há três anos que – desde que me chegaram umas estagiárias de top, calções e alpercatas à redacção – que passei a ter de explicar como se veste num local de trabalho. "Estás bem para ir para a praia, não para ires a uma conferência de imprensa com o ministro das Finanças... Não podes ir porque estás a representar um órgão de comunicação social e não o concurso da miss t-shirt molhada."
Além de explicar como se vestem – era em casa que deviam ter aprendido; e se não o fizeram, então na escola e na faculdade alguém lhes podia ter chamado a atenção. Por isso, as regras nas secundárias são um bom princípio –, também os ensino a falar. "Não se trata ninguém por 'você', mas pelo título, 'senhor ministro', 'senhor director', 'doutor', 'engenheiro', 'professor'. Ou se a pessoa te disser para a tratares pelo seu nome, não dizes 'você isto, você aquilo', mas 'o Nuno isto, a Maria aquilo'."
Talvez porque estejam habituados a comunicar por mensagens, não sabem como se fala ao telefone. Mais uma aula. "Bom dia, o meu nome é Mariana Alcoforado, sou estagiária no PÚBLICO, desejava falar com o marquês de Chamilly, é possível?". Ensino a dizer 'eu aguardo', 'por favor', 'obrigada', 'até à próxima'....
Há uns tempos, uma estagiária deu-me um recado e quando terminou eu respondi-lhe: "Não é 'poqe', é 'porque'; não é 'tá', é 'está'; não é 'po' é 'por'; não é 'tefonei', é 'telefonei'. Se não souberes falar correctamente, como é que a pessoa com quem estás a falar confia no que vais escrever? Como é que ela te vai respeitar profissionalmente?"
Cabia à escola ensinar-lhes tudo isto? Não. Há família. Mas, na escola, se ouvirem os adultos a falarem bem, de certeza que aprenderão a fazê-lo.
BW
Há escolas que já o fazem, respondo. Não há calções, tops ou chinelos no interior do estabelecimento de ensino. Há escolas que vão mais longe, as privadas, que substituem a roupa do dia-a-dia por uniformes.
O uniforme é óptimo para as manhãs dos pais, só há aquilo para vestir por isso não há como discutir se a criança se demora muito a escolher a roupa ou a pedir-lhe para trocar os calções da praia pelas calças. O uniforme é óptimo para a escola, os seus alunos publicitam-na por onde passam – "Olha, aquele anda no... Olha, aquela é do..." O uniforme também pode ser bom para os alunos, andam todos de igual e ponto, não há marcas, não há roupas baratas ou caras.
Mas apesar de todos os aparentes benefícios do uniforme, prefiro que não o usem. Prefiro que sejam eles a escolhê-lo porque, a verdade, nas escolas onde o uniforme não é obrigatório, todos andam de uniforme, as roupas deles e delas são todas iguais, as marcas que privilegiam são as mesmas.
Deixá-los ter liberdade para as escolher desde que o façam connosco e aqui o papel dos pais é fundamental. Educá-los. Educá-los para saberem que não é apropriado usar uns calções de praia e uns chinelos para ir para a escola ou para a faculdade. Educá-los para saberem que "vestir bem" não é envergar uma roupa própria para ir a um casamento ou à discoteca.
Se há uns tempos não era preciso dizer isto a ninguém, há três anos que – desde que me chegaram umas estagiárias de top, calções e alpercatas à redacção – que passei a ter de explicar como se veste num local de trabalho. "Estás bem para ir para a praia, não para ires a uma conferência de imprensa com o ministro das Finanças... Não podes ir porque estás a representar um órgão de comunicação social e não o concurso da miss t-shirt molhada."
Além de explicar como se vestem – era em casa que deviam ter aprendido; e se não o fizeram, então na escola e na faculdade alguém lhes podia ter chamado a atenção. Por isso, as regras nas secundárias são um bom princípio –, também os ensino a falar. "Não se trata ninguém por 'você', mas pelo título, 'senhor ministro', 'senhor director', 'doutor', 'engenheiro', 'professor'. Ou se a pessoa te disser para a tratares pelo seu nome, não dizes 'você isto, você aquilo', mas 'o Nuno isto, a Maria aquilo'."
Talvez porque estejam habituados a comunicar por mensagens, não sabem como se fala ao telefone. Mais uma aula. "Bom dia, o meu nome é Mariana Alcoforado, sou estagiária no PÚBLICO, desejava falar com o marquês de Chamilly, é possível?". Ensino a dizer 'eu aguardo', 'por favor', 'obrigada', 'até à próxima'....
Há uns tempos, uma estagiária deu-me um recado e quando terminou eu respondi-lhe: "Não é 'poqe', é 'porque'; não é 'tá', é 'está'; não é 'po' é 'por'; não é 'tefonei', é 'telefonei'. Se não souberes falar correctamente, como é que a pessoa com quem estás a falar confia no que vais escrever? Como é que ela te vai respeitar profissionalmente?"
Cabia à escola ensinar-lhes tudo isto? Não. Há família. Mas, na escola, se ouvirem os adultos a falarem bem, de certeza que aprenderão a fazê-lo.
BW
sábado, 30 de maio de 2015
"Obrigada pelo que faz por nós"
Gosto de ir às escolas! Gosto quando, como ontem, na Escola Secundária Inês de Castro, em Gaia, uma escola premiada, o director me recebe com orgulho do estabelecimento de ensino que dirige; quando os professores mostram o trabalho de um ano, feito com os seus alunos; quando os estudantes se envolvem nas actividades propostas pela escola; quando os pais estão presentes e só têm bem a dizer de toda a comunidade educativa.
Esta é uma semana difícil, as aulas estão a terminar e os alunos do secundário empenharam-se nesta actividade. São eles que me dão as boas-vindas, que prepararam as apresentações. Fizeram um vídeo sobre a evolução da educação, tocam e cantam. Sinto-me verdadeiramente humilde e envergonhada com todo o trabalho. Mas, atenção, não é tudo para mim, aquele é um sarau cultural, onde a minha intervenção é um dos pontos do programa. A escola faz, pelo menos, quatro por ano, abertos à comunidade, e para os quais convida um autor ou escritor.
A conversa corre sobre a relação família/escola. Uma das professoras presente pergunta: "Porque esperam as famílias que a escola faça tudo? Porque se demitem?" Porque é fácil e – apesar de estar acordada desde as seis da manhã, ter um dia de trabalho em cima, ter apanhado um comboio para Campanhã, ter tido uma reunião na Porto Editora, e serem dez da noite –, consigo fazer um trocadilho: "O professor Marçal Grilo escreveu um livro que se chamava "Difícil é sentá-los" eu diria que "difícil é educá-los" porque se os soubermos educar bem, a escola não terá dificuldade em sentá-los." E dou um exemplo concreto: é fácil para os pais deixar uma criança levantar-se da mesa, durante a refeição, não lhe dizer nada. Depois quando chega à escola não sabe estar sentada durante 90 minutos. É fácil mandá-los para a cama às 22h e andarmos de 20 em 20 minutos a insistir e desistirmos. E depois esperarmos que a escola faça o que devíamos ter feito. Quantos pais chegam à escola e pedem aos professores: Veja lá se faz alguma coisa dele, que eu não consigo...
Outra professora agradece por eu recomendar que não se fale mal dos professores – se as famílias não o fizerem, os miúdos terão mais respeito pelos docentes, insisto sempre; diz que é uma pena os pais que deviam ouvir-me não estarem ali ou não lerem o livro. Respondo que a queixa que ouço aos professores é exactamente a mesma: os pais que deviam não vêm à escola, mas também não é fácil para esses pais. Imaginem o que é, como relato neste livro, um pai que está numa reunião com outros pais e tem um director de turma a dizer-lhe – o seu filho porta-se mal, o seu filho não faz os trabalhos, o seu filho é mal-educado... – ninguém gosta, ninguém quer vir à escola para ouvir falar mal do seu filho. Mas há estratégias que podem ser implementadas, convidar os pais para uma festa, propor-lhes numa actividade, por exemplo, é preciso pintar uma parede... Há pequenos truques que podem trazer os pais à escola, envolvê-los e depois abrir espaço para conversar sobre o educando.
Para terminar, uma docente defende que o contacto entre a escola e os encarregados de educação deve ser diminuto. Preparo-me para discordar, mas a professora continua: Se o aluno for bem educado, se eu disser 'senta-te' e se ele se sentar, não preciso de falar com os pais. De acordo, mas isso é na escola ideal, isso é quando todos os pais se comprometerem realmente com a educação dos seus filhos. No entanto, a escola deve manter sempre os pais informados.
No final, durante o Porto de honra, já passa da meia-noite e a conversa continua. Uma professora lamenta o que a sociedade diz dos docentes, como se sentem mal tratados. Concordo. Outro pergunta-se como é possível haver tantos colegas que fazem más opções, que não têm bom senso, que dão mau nome à classe. Há bons e maus profissionais, respondo. Muito fazem os professores a quem tudo é exigido, que ensinem, que eduquem, que identifiquem os meninos com fome, com problemas em casa, com dificuldades, que façam projectos... Tudo lhes é exigido e as famílias demitem-se, dizem. As famílias e o Estado, acrescento. Porque se os pais tivessem melhores condições de trabalho, horários mais flexíveis, poderiam ser melhores pais, acredito.
São horas de sair. "Obrigada pelo que faz por nós", despedem-se os professores.
BW
Esta é uma semana difícil, as aulas estão a terminar e os alunos do secundário empenharam-se nesta actividade. São eles que me dão as boas-vindas, que prepararam as apresentações. Fizeram um vídeo sobre a evolução da educação, tocam e cantam. Sinto-me verdadeiramente humilde e envergonhada com todo o trabalho. Mas, atenção, não é tudo para mim, aquele é um sarau cultural, onde a minha intervenção é um dos pontos do programa. A escola faz, pelo menos, quatro por ano, abertos à comunidade, e para os quais convida um autor ou escritor.
A conversa corre sobre a relação família/escola. Uma das professoras presente pergunta: "Porque esperam as famílias que a escola faça tudo? Porque se demitem?" Porque é fácil e – apesar de estar acordada desde as seis da manhã, ter um dia de trabalho em cima, ter apanhado um comboio para Campanhã, ter tido uma reunião na Porto Editora, e serem dez da noite –, consigo fazer um trocadilho: "O professor Marçal Grilo escreveu um livro que se chamava "Difícil é sentá-los" eu diria que "difícil é educá-los" porque se os soubermos educar bem, a escola não terá dificuldade em sentá-los." E dou um exemplo concreto: é fácil para os pais deixar uma criança levantar-se da mesa, durante a refeição, não lhe dizer nada. Depois quando chega à escola não sabe estar sentada durante 90 minutos. É fácil mandá-los para a cama às 22h e andarmos de 20 em 20 minutos a insistir e desistirmos. E depois esperarmos que a escola faça o que devíamos ter feito. Quantos pais chegam à escola e pedem aos professores: Veja lá se faz alguma coisa dele, que eu não consigo...
Outra professora agradece por eu recomendar que não se fale mal dos professores – se as famílias não o fizerem, os miúdos terão mais respeito pelos docentes, insisto sempre; diz que é uma pena os pais que deviam ouvir-me não estarem ali ou não lerem o livro. Respondo que a queixa que ouço aos professores é exactamente a mesma: os pais que deviam não vêm à escola, mas também não é fácil para esses pais. Imaginem o que é, como relato neste livro, um pai que está numa reunião com outros pais e tem um director de turma a dizer-lhe – o seu filho porta-se mal, o seu filho não faz os trabalhos, o seu filho é mal-educado... – ninguém gosta, ninguém quer vir à escola para ouvir falar mal do seu filho. Mas há estratégias que podem ser implementadas, convidar os pais para uma festa, propor-lhes numa actividade, por exemplo, é preciso pintar uma parede... Há pequenos truques que podem trazer os pais à escola, envolvê-los e depois abrir espaço para conversar sobre o educando.
Para terminar, uma docente defende que o contacto entre a escola e os encarregados de educação deve ser diminuto. Preparo-me para discordar, mas a professora continua: Se o aluno for bem educado, se eu disser 'senta-te' e se ele se sentar, não preciso de falar com os pais. De acordo, mas isso é na escola ideal, isso é quando todos os pais se comprometerem realmente com a educação dos seus filhos. No entanto, a escola deve manter sempre os pais informados.
No final, durante o Porto de honra, já passa da meia-noite e a conversa continua. Uma professora lamenta o que a sociedade diz dos docentes, como se sentem mal tratados. Concordo. Outro pergunta-se como é possível haver tantos colegas que fazem más opções, que não têm bom senso, que dão mau nome à classe. Há bons e maus profissionais, respondo. Muito fazem os professores a quem tudo é exigido, que ensinem, que eduquem, que identifiquem os meninos com fome, com problemas em casa, com dificuldades, que façam projectos... Tudo lhes é exigido e as famílias demitem-se, dizem. As famílias e o Estado, acrescento. Porque se os pais tivessem melhores condições de trabalho, horários mais flexíveis, poderiam ser melhores pais, acredito.
São horas de sair. "Obrigada pelo que faz por nós", despedem-se os professores.
BW
quarta-feira, 20 de maio de 2015
A escola é uma merda
"Não há nenhum respeito por nós, nem pelo professor. A escola é uma merda", diz-me ela a chorar. Não sou capaz de a repreender pela asneira dita, mas faço uma nota mental "quando isto passar, digo-lhe que não pode dizer asneiras".
A duas semanas de as aulas acabarem, faltam apenas cinco tempos lectivos naquela disciplina, o professor que esteve de baixa um ano inteiro decide regressar. Tem de regressar, para continuar a ser docente naquela escola, tem de voltar porque a baixa terminou ou porque sim, não quero saber.
É este professor que não esteve com as turmas que vai agora avaliá-las, depois de todo o trabalho que o outro docente levou a cabo? Parece que sim.
E a escola acha normal. É assim... O sistema é assim... As regras são assim e não há como não cumpri-las. A direcção encolhe os ombros e siga para bingo, que se lixem os miúdos, que se lixe o professor que sempre soube que era substituto, bem-vindo colega que já sabemos que para o ano vai voltar a ficar de baixa, mas não se preocupe que depois virá um substituto, não sabemos é se será tão bom como este, mas o importante é que é um colega, mais um colega. Ah, os colegas...
"Não há nenhum respeito por nós, nem pelo professor. A escola é uma merda".
Não há respeito pelos alunos que, pela tiveram um professor com "P" grande. O único a quem eles não faltam ao respeito – "um dia tenho de ir ver as aulas do colega", diz a directora de turma quando confrontada com esse facto. Talvez tenha alguma coisa a aprender com o colega, continua, pouco convencida... Como se já tivesse aprendido tudo, como se nada mais houvesse para aprender, sem qualquer humildade que isso é para os das ciências sociais, os das exactas têm certezas absolutas, por exemplo, têm a certeza absoluta que as suas cadeiras são as mais importantes!
O único que os põe a pensar – ah, mas a disciplina também se presta a isso, é Filosofia... Bom, mas os meninos já tiveram antes Filosofia e só empinaram.
O único que os contacta via email, com trabalhos, com partilhas, com incentivos, com sugestões.
O único que os cativa, que lhes propõe tarefas diferentes, que lhes ralha com razão, que não os diminui, não os ridiculariza, não os atormenta – como a professora que lhes disse: "Façam o que façam nos exames, vão ter péssimas notas porque os professores estão muito desmotivados com este ministério."
O único que é Professor.
O professor explica a situação. Despede-se. Os alunos choram e abraçam-no. Querem lutar por ele, conta-me ela, entre soluços. Vão fazer um abaixo-assinado, uma petição. Vão juntar as turmas todas. Querem ir ao ministério. Sorrio, complacente, quase cínica. Como é bela e inocente a adolescência! "Sim, vale a pena lutar!", incentivo-a. Ela está a aplicar o que lhe ensinamos. Os colegas estão a aplicar o que aprenderam com o professor. A pensarem, a serem cidadãos, a lutar pelos seus direitos, e têm os pais do seu lado. Espero que a escola não encolha os ombros.
BW
A duas semanas de as aulas acabarem, faltam apenas cinco tempos lectivos naquela disciplina, o professor que esteve de baixa um ano inteiro decide regressar. Tem de regressar, para continuar a ser docente naquela escola, tem de voltar porque a baixa terminou ou porque sim, não quero saber.
É este professor que não esteve com as turmas que vai agora avaliá-las, depois de todo o trabalho que o outro docente levou a cabo? Parece que sim.
E a escola acha normal. É assim... O sistema é assim... As regras são assim e não há como não cumpri-las. A direcção encolhe os ombros e siga para bingo, que se lixem os miúdos, que se lixe o professor que sempre soube que era substituto, bem-vindo colega que já sabemos que para o ano vai voltar a ficar de baixa, mas não se preocupe que depois virá um substituto, não sabemos é se será tão bom como este, mas o importante é que é um colega, mais um colega. Ah, os colegas...
"Não há nenhum respeito por nós, nem pelo professor. A escola é uma merda".
Não há respeito pelos alunos que, pela tiveram um professor com "P" grande. O único a quem eles não faltam ao respeito – "um dia tenho de ir ver as aulas do colega", diz a directora de turma quando confrontada com esse facto. Talvez tenha alguma coisa a aprender com o colega, continua, pouco convencida... Como se já tivesse aprendido tudo, como se nada mais houvesse para aprender, sem qualquer humildade que isso é para os das ciências sociais, os das exactas têm certezas absolutas, por exemplo, têm a certeza absoluta que as suas cadeiras são as mais importantes!
O único que os põe a pensar – ah, mas a disciplina também se presta a isso, é Filosofia... Bom, mas os meninos já tiveram antes Filosofia e só empinaram.
O único que os contacta via email, com trabalhos, com partilhas, com incentivos, com sugestões.
O único que os cativa, que lhes propõe tarefas diferentes, que lhes ralha com razão, que não os diminui, não os ridiculariza, não os atormenta – como a professora que lhes disse: "Façam o que façam nos exames, vão ter péssimas notas porque os professores estão muito desmotivados com este ministério."
O único que é Professor.
O professor explica a situação. Despede-se. Os alunos choram e abraçam-no. Querem lutar por ele, conta-me ela, entre soluços. Vão fazer um abaixo-assinado, uma petição. Vão juntar as turmas todas. Querem ir ao ministério. Sorrio, complacente, quase cínica. Como é bela e inocente a adolescência! "Sim, vale a pena lutar!", incentivo-a. Ela está a aplicar o que lhe ensinamos. Os colegas estão a aplicar o que aprenderam com o professor. A pensarem, a serem cidadãos, a lutar pelos seus direitos, e têm os pais do seu lado. Espero que a escola não encolha os ombros.
BW
terça-feira, 19 de maio de 2015
Provas finais de ciclo de Português, 4º e 6º anos
Estranho os parcos e antagónicos comentários às provas finais de ciclo.
Quanto à do 4.º ano, houve quem a classificasse como fácil, outros como desadequada à faixa etária e metas. Atendendo a que, ao contrário de anos anteriores, o texto informativo não continha linguagem particularmente técnica, por se tratar de um excerto de um livro adequado ao 1.º ciclo ("A minha primeira enciclopédia") e o texto literário fazia parte do corpus proposto pelas metas, parece-me que a escolha textual foi acertada. Quanto ao questionário, também este se me afigura como grau de dificuldade adequado ao 4.º ano.
Relativamente à prova de hoje, 6.º ano, poucos ou nenhuns comentários. E o padrão repete-se: texto informativo de complexidade adequada (Enciclopédia Fleurus Juvenil) e excerto de Ali Babá e os quarenta ladrões, obra também recomendada pelas metas. De igual modo, as perguntas de interpretação tinham formulação e grau de complexidade adequados. Quanto à gramática, as perguntas foram inócuas, sem oblíquos, quantificadores ou modificadores.
Resumindo, um clima de harmonia "textual" com as metas, mas sem levantar celeumas ou discussões. Claro! Qualquer mau resultado nestas provas condenaria os novos programas e metas. O sucesso das classificações, que se conhecerão em junho, será motivo para reiterar a sua validade. Alegrar-me-ei, futuramente, com o sucesso dos alunos. Questiono agora o que se anda a fazer no ensino. Aguardemos pelas provas de matemática e vejamos o que as mesmas nos dizem.
Quanto à do 4.º ano, houve quem a classificasse como fácil, outros como desadequada à faixa etária e metas. Atendendo a que, ao contrário de anos anteriores, o texto informativo não continha linguagem particularmente técnica, por se tratar de um excerto de um livro adequado ao 1.º ciclo ("A minha primeira enciclopédia") e o texto literário fazia parte do corpus proposto pelas metas, parece-me que a escolha textual foi acertada. Quanto ao questionário, também este se me afigura como grau de dificuldade adequado ao 4.º ano.
Relativamente à prova de hoje, 6.º ano, poucos ou nenhuns comentários. E o padrão repete-se: texto informativo de complexidade adequada (Enciclopédia Fleurus Juvenil) e excerto de Ali Babá e os quarenta ladrões, obra também recomendada pelas metas. De igual modo, as perguntas de interpretação tinham formulação e grau de complexidade adequados. Quanto à gramática, as perguntas foram inócuas, sem oblíquos, quantificadores ou modificadores.
Resumindo, um clima de harmonia "textual" com as metas, mas sem levantar celeumas ou discussões. Claro! Qualquer mau resultado nestas provas condenaria os novos programas e metas. O sucesso das classificações, que se conhecerão em junho, será motivo para reiterar a sua validade. Alegrar-me-ei, futuramente, com o sucesso dos alunos. Questiono agora o que se anda a fazer no ensino. Aguardemos pelas provas de matemática e vejamos o que as mesmas nos dizem.
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segunda-feira, 18 de maio de 2015
Critérios de classificação das provas finais de ciclo e exames
É no site do IAVE que pode encontrar as provas de Português e Matemática e os respetivos critérios de classificação.
Poucas horas depois da realização das mesmas, são aqui disponibilizadas estas informações.
Poucas horas depois da realização das mesmas, são aqui disponibilizadas estas informações.
domingo, 17 de maio de 2015
Mais uma época de exames
Esta semana, abre oficialmente a nova época de exames, com os alunos do 4.º e 6.º anos a serem avaliados.
As provas finais de ciclo de Matemática e Português visarão atestar o conhecimento adquirido e as competências desenvolvidas ao longo dos respetivos ciclos. Psicólogos e professores concordarão na importância da avaliação e nos processos cognitivos que a mesma gera, consolidando os saberes. Todavia, a grande questão que estes exames e provas finais nos colocam é em tudo semelhante à que se nos colocou em anos anteriores e diz respeito a esta espécie de obsessão que está a tomar conta da nossa Escola, que tudo quer avaliar e certificar, ainda que:
- com programas/metas discutíveis e controversos;
- timmings desadequados aos do ritmo das escolas;
- professores sobrecarregados com tarefas letivas e reuniões de classificação de provas, etc.
Todos conhecemos escolas onde, no 1.º ciclo, o Estudo do Meio foi relegado para segundo plano, a fim de preparar os meninos para as provas; todos ouvimos falar nas escolas que interrompem atividades letivas a fim de organizar o processo de avaliação; todos vimos notícias sobre a angústia dos professores, nomeadamente de matemática, decorrente da dificuldade em"dar" [literalmente "dar"] o programa até ao fim antes do exame, assumindo que é impossível treinar, deixar que os alunos interiorizem processos, muitos deles desadequados aos estádios de desenvolvimento, aspecto este em que, uma vez mais, professores e psicólogos estão de acordo.
Todos sabemos dos erros que estão a ser cometidos. Mas parece que "quem de direito" continua a insistir nesta cultura do pretenso rigor da avaliação.
A todos, professores e alunos, votos de uma boa época de exames!
As provas finais de ciclo de Matemática e Português visarão atestar o conhecimento adquirido e as competências desenvolvidas ao longo dos respetivos ciclos. Psicólogos e professores concordarão na importância da avaliação e nos processos cognitivos que a mesma gera, consolidando os saberes. Todavia, a grande questão que estes exames e provas finais nos colocam é em tudo semelhante à que se nos colocou em anos anteriores e diz respeito a esta espécie de obsessão que está a tomar conta da nossa Escola, que tudo quer avaliar e certificar, ainda que:
- com programas/metas discutíveis e controversos;
- timmings desadequados aos do ritmo das escolas;
- professores sobrecarregados com tarefas letivas e reuniões de classificação de provas, etc.
Todos conhecemos escolas onde, no 1.º ciclo, o Estudo do Meio foi relegado para segundo plano, a fim de preparar os meninos para as provas; todos ouvimos falar nas escolas que interrompem atividades letivas a fim de organizar o processo de avaliação; todos vimos notícias sobre a angústia dos professores, nomeadamente de matemática, decorrente da dificuldade em"dar" [literalmente "dar"] o programa até ao fim antes do exame, assumindo que é impossível treinar, deixar que os alunos interiorizem processos, muitos deles desadequados aos estádios de desenvolvimento, aspecto este em que, uma vez mais, professores e psicólogos estão de acordo.
Todos sabemos dos erros que estão a ser cometidos. Mas parece que "quem de direito" continua a insistir nesta cultura do pretenso rigor da avaliação.
A todos, professores e alunos, votos de uma boa época de exames!
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sábado, 16 de maio de 2015
Preparar provas finais de ciclo e exames
É no site do Iave que se encontram as provas dos anos anteriores e respetivos critérios de classificação, que são uma importante ferramenta para os alunos se prepararem para as provas finais de ciclo de matemática e de português do 4.º e do 6.º anos.
Provas do 4.º ano aqui.
provas do 6.º ano aqui.
Provas do 4.º ano aqui.
provas do 6.º ano aqui.
quarta-feira, 15 de abril de 2015
A esquizofrenia de quem escreve pré-AO
Na terça-feira, um conjunto de professoras da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa organizaram um encontro contra o acordo ortográfico (AO). Convidaram-me para fazer uma pequena intervenção e aceitei o convite porque tenho uma dívida de gratidão para com a professora Cristina Pimentel, responsável pelo Centro de Estudos Clássicos daquela instituição e é quem nos revê (a mim e à Ana Soares) os livros do Olimpvs.net, além de produzir conteúdos para o nosso site. Como dizer que não?
A intervenção que preparei era curta. Mas tornou-se ainda mais curta, face ao adiantado da hora e ao número de pessoas que ainda iria falar. Aqui fica a versão completa:
A intervenção que preparei era curta. Mas tornou-se ainda mais curta, face ao adiantado da hora e ao número de pessoas que ainda iria falar. Aqui fica a versão completa:
A minha luta com o AO começou nos finais dos
anos de 1990, na faculdade, quando este nos foi apresentado. “Mas que
disparate!”, pensei, à medida que o professor nos falava a evolução da escrita
do Português, das principais mudanças e de nós, os alunos, criticarmos coisas
que nos pareciam tão estapafúrdias como “Egipto“ (sem "p") e “egípcio”. Lembro-me do
professor relativizar e comentar que certamente também custou aos portugueses
deixar de escrever farmácia com “ph”, como quem diz que era
só uma questão de nos adaptarmos.
Passaram 20 anos, desde que fui apresentada ao acordo e não
vou discuti-lo, antes falar da minha experiência do dia-a-dia. Ao meu texto chamei “a
esquizofrenia de quem escreve ‘à antiga’” e passo a explicar: Os meus dias são passados a editar textos.
Edito textos de colegas que escrevem como eu e como todos os jornalistas do
PÚBLICO, ‘à antiga’; mas também dos estagiários que escrevem com o novo acordo;
dos comentadores e opinion makers que, uns escrevem à antiga e outros à
moderna! E aos quais devo todo o meu respeito pelas suas decisões, embora saiba
que muitos escrevem só porque o programa no computador os impele a fazê-lo.
Nada mais.
Edito ainda as notícias da Lusa que escreve à moderna. E aí,
os meus dedos no teclado estão entre o “c” e o “p”. Para quem ainda escreve ‘à
antiga’, não imaginam a quantidade de “c”, sobretudo de “c” que caíram! Por
exemplo, na frase “Este foi o primeiro estudo a quantificar os múltiplos
factores ambientais que afectam o Oceano Antárctico” caíram três, a saber:
factores, afectam, Antárctico.
Além de acrescentar letras, mudo minúsculas para maiúsculas
nos meses do ano, nas estações do ano, nos pontos cardeais… Mais os hífens nos fins-de-semana, cor-de-rosa...
E, durante as minhas horas de expediente, cada take da Lusa
que cai, se me interessa publicá-lo no site, é um texto que encho se “c” e “p”
que se perderam pela linha da Internet.
Depois, quando saio do jornal e me sento à frente do meu
computador, em casa, para escrever sobre heróis do Olimpvs.net ou livros para
professores e pais, tenho de fazer o exercício oposto: tirar todos os “c” e os
“p” porque não há editora que não se tenha rendido ao acordo!
Ah! Então o problema é só os “c” e os “p”, pensará a plateia.
Não, é mais do que isso. O escrever com o acordo obriga-me a reformular frases,
a dar voltas, a ser criativa só porque me recuso a escrever, por exemplo,
“pára” sem acento. Um herói à altura de viver aventuras não “para”. Jamais
“para para” falar com alguém. Ele “pára”, com acento. Mas como não o pode fazer
com o novo acordo, um deus do Olimpo “estaca”, “abranda o passo até parar”,
“detém-se perante o vilão”, mas nunca “para”.
Chamem-me velha do Restelo, mas os novos como os meus filhos
adolescentes que são obrigados a escrever com o acordo sob pena de serem
penalizados nos exames nacionais do secundário, acham-no igualmente estúpido. Também
eles são uns velhos do Restelo. Saem à mãe!
Obrigada
quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015
O que é um jornal?
E, de repente, no Colégio de Monte Maior, em Loures, descobri o porquê da quebra de vendas dos jornais.
A uma pergunta sobre como é que a Ana Soares e a Bárbara Wong têm tempo para escrever o Olimpvs.net, a primeira começa a explicar, para de imediato ser interrompida: "Nós não escrevemos só o Olimpvs. Nós temos os nossos trabalhos... Eu sou professora e a Bárbara é jornalista.."
– Jornalista?!? De que canal? –, perguntam as meninas que estão sentadas na primeira fila, entusiasmadas.
– Não é um canal, é um jornal –, respondo solicita e percebo que elas não fazem ideia do que estou a falar. Atrapalhada com o silêncio, faço um gesto, desenhando um rectângulo no ar: – Um jornal... em papel... que se folheia...
Estamos a falar para uma plateia constituída por meninos de 12 anos, de um colégio, com bons telefones nas mãos e pelo menos um tablet pousado nas pernas de um deles.
– Ah! Já sei! É aquela coisa que eles têm nas novelas, quando estão a tomar o pequeno-almoço! – diz uma delas, esclarecida.
A Ana, muito pedagógica, ainda fala da revista de imprensa que é feita nos canais noticiosos, mas eu corto-lhe a palavra:
– Sim, são aquelas folhas de papel que as personagens das novelas folheiam ao pequeno-almoço. Isso é um jornal.
Eles nunca viram um jornal à mesa do seu pequeno-almoço. É natural, ninguém come pequenos-almoços como os das novelas com sumos, diversos tipos de pão, bolos e frutas, compotas e cereais. Mas também nunca o viram na mesa do café? Na praia? Na esplanada? Parece que não.
BW
A uma pergunta sobre como é que a Ana Soares e a Bárbara Wong têm tempo para escrever o Olimpvs.net, a primeira começa a explicar, para de imediato ser interrompida: "Nós não escrevemos só o Olimpvs. Nós temos os nossos trabalhos... Eu sou professora e a Bárbara é jornalista.."
– Jornalista?!? De que canal? –, perguntam as meninas que estão sentadas na primeira fila, entusiasmadas.
– Não é um canal, é um jornal –, respondo solicita e percebo que elas não fazem ideia do que estou a falar. Atrapalhada com o silêncio, faço um gesto, desenhando um rectângulo no ar: – Um jornal... em papel... que se folheia...
Estamos a falar para uma plateia constituída por meninos de 12 anos, de um colégio, com bons telefones nas mãos e pelo menos um tablet pousado nas pernas de um deles.
– Ah! Já sei! É aquela coisa que eles têm nas novelas, quando estão a tomar o pequeno-almoço! – diz uma delas, esclarecida.
A Ana, muito pedagógica, ainda fala da revista de imprensa que é feita nos canais noticiosos, mas eu corto-lhe a palavra:
– Sim, são aquelas folhas de papel que as personagens das novelas folheiam ao pequeno-almoço. Isso é um jornal.
Eles nunca viram um jornal à mesa do seu pequeno-almoço. É natural, ninguém come pequenos-almoços como os das novelas com sumos, diversos tipos de pão, bolos e frutas, compotas e cereais. Mas também nunca o viram na mesa do café? Na praia? Na esplanada? Parece que não.
BW
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A importância de se chamar Wong
É sempre muito bom falar com os alunos nas escolas! Eles dizem coisas divertidas, umas vezes, e perturbantes, outras.
No Colégio de Monte Maior, em Montemor, Loures, os alunos de 6.º ano são os últimos a passar pelo auditório naquela sexta-feira, já ao final do dia. Estão cansados e há quase meia-dúzia que não resiste e vai fechando os olhos, sem conseguir ouvir o que eu e a Ana Soares dizemos. Mas, no final da apresentação, acordam e, recuperada a energia, fazem perguntas, muitas!
Há uma pergunta que é raro não ser feita nas apresentações Olimpvs.net: porque razão eu me chamo Wong. É natural, se há ministros e reitores que o perguntam porque não hão-de fazer os mais pequenos?
Respondo de forma abreviada ou mais explicada conforme a pergunta me é feita. Há um ano, numa escola no Ribatejo um aluno colocou a questão, ao mesmo tempo que cotovelava os colegas, prontos para começarem a rir, mal eu desse a resposta: fui seca, quase mal educada como os garotos estavam a ser. Arrependi-me no mesmo instante, mas naquele momento senti-me da idade deles, andei 30 anos para trás e vi os miúdos da minha escola a fazerem-me pirraça.
No início do mês, uma menina curiosa, em Bragança, perguntou de maneira delicada: "Há uma questão que nos intriga: por que se chama Wong?" Não resisti, dei uma gargalhada e expliquei.
Desta vez, em Montemor, a menina que pergunta está ao lado de outra que se parece muito com uma das minhas irmãs – com aquele tom de pele amarelado, os cabelos negros, lisos e compridos e os olhos rasgados. "Uma pergunta: de onde vem o seu nome?"
"Vem do meu pai que é chinês!", respondo simpática. "Mas não parece nada! A mãe dela é tailandesa...", diz-me. "Pois, já tinha percebido!", digo, olhando para a outra rapariga, tal e qual como a minha irmã, por onde passa dizem-lhe que parece tailandesa, vietnamita, índia...
Ela olha-me como se eu não tivesse estado à sua frente durante 50 minutos e concorda com a amiga. "O seu pai é chinês?! A senhora saiu muito mal misturada!...", repara com um tom quase zangado.
Pois, mesmo mal misturada sei o que é ser gozada no recreio ou dentro da sala de aula. Tal como ela deve saber, penso ao interpretar o seu tom ofendido.
BW
No Colégio de Monte Maior, em Montemor, Loures, os alunos de 6.º ano são os últimos a passar pelo auditório naquela sexta-feira, já ao final do dia. Estão cansados e há quase meia-dúzia que não resiste e vai fechando os olhos, sem conseguir ouvir o que eu e a Ana Soares dizemos. Mas, no final da apresentação, acordam e, recuperada a energia, fazem perguntas, muitas!
Há uma pergunta que é raro não ser feita nas apresentações Olimpvs.net: porque razão eu me chamo Wong. É natural, se há ministros e reitores que o perguntam porque não hão-de fazer os mais pequenos?
Respondo de forma abreviada ou mais explicada conforme a pergunta me é feita. Há um ano, numa escola no Ribatejo um aluno colocou a questão, ao mesmo tempo que cotovelava os colegas, prontos para começarem a rir, mal eu desse a resposta: fui seca, quase mal educada como os garotos estavam a ser. Arrependi-me no mesmo instante, mas naquele momento senti-me da idade deles, andei 30 anos para trás e vi os miúdos da minha escola a fazerem-me pirraça.
No início do mês, uma menina curiosa, em Bragança, perguntou de maneira delicada: "Há uma questão que nos intriga: por que se chama Wong?" Não resisti, dei uma gargalhada e expliquei.
Desta vez, em Montemor, a menina que pergunta está ao lado de outra que se parece muito com uma das minhas irmãs – com aquele tom de pele amarelado, os cabelos negros, lisos e compridos e os olhos rasgados. "Uma pergunta: de onde vem o seu nome?"
"Vem do meu pai que é chinês!", respondo simpática. "Mas não parece nada! A mãe dela é tailandesa...", diz-me. "Pois, já tinha percebido!", digo, olhando para a outra rapariga, tal e qual como a minha irmã, por onde passa dizem-lhe que parece tailandesa, vietnamita, índia...
Ela olha-me como se eu não tivesse estado à sua frente durante 50 minutos e concorda com a amiga. "O seu pai é chinês?! A senhora saiu muito mal misturada!...", repara com um tom quase zangado.
Pois, mesmo mal misturada sei o que é ser gozada no recreio ou dentro da sala de aula. Tal como ela deve saber, penso ao interpretar o seu tom ofendido.
BW
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sábado, 10 de janeiro de 2015
nascemos, nascemos, nascemos
Enganam-se os que pensam que só nascemos uma vez.
Para quem quiser ver a vida está cheia de nascimentos.Nascemos muitas vezes ao longo da infância
quando os olhos se abrem em espanto e alegria.
Nascemos nas viagens sem mapa que a juventude arrisca.
Nascemos na sementeira da vida adulta,
entre invernos e primaveras maturando
a misteriosa transformação que coloca na haste a flor
e dentro da flor o perfume do fruto.
Nascemos muitas vezes naquela idade
onde os trabalhos não cessam, mas reconciliam-se
com laços interiores e caminhos adiados.
Enganam-se os que pensam que só nascemos uma vez.
Nascemos quando nos descobrimos amados e capazes de amar.
Nascemos no entusiasmo do riso e na noite de algumas lágrimas.
Nascemos na prece e no dom.
Nascemos no perdão e no confronto.
Nascemos em silêncio ou iluminados por uma palavra.
Nascemos na tarefa e na partilha.
Nascemos nos gestos ou para lá dos gestos.
Nascemos dentro de nós e no coração de Deus.
José Tolentino Mendonça
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