"Mas houve uma menina que gostava como ninguém das praias. Nessa altura já havia a palavra “amor” e todos percebiam que ela amava o mar. Pelo dia fora corria a praia, dançava com os pássaros, brincava com as ondas, escondia-se na areia. Quando à noite ia dormir para casa, cada gesto que fazia cheirava a mar, lembrava o mar.
Mas vieram os frios. O tempo da casa. O tempo do trabalho. Cada vez mais triste, cada vez mais quieta, a menina passava o tempo sentada na praia, sem forças nem alegria tentando meter o mar dentro dela. E chegou o dia em que o pai teve de a ir buscar à praia Também estava triste o pai. E procurou conversar com ela, com as palavras que então havia. Mas ela só chorava. E quando devagarinho o pai lhe pegou ao colo, entre lágrimas nasceu da boca de uma menina a palavra “saudade”. Nessa altura uma grande onda espalhou junto aos dois muitos búzios e conchas. O pai pousou a filha no chão e começaram a apanhá-los. De repente cheio de alegria ele disse à filha uma palavra nova que o seu coração naquele instante lhe ensinara: “recordações”.
E cheios de búzios e conchas entraram, sorrindo, pelo inverno dentro.
Desde então sempre que a palavra “saudade” entristece as mães, os filhos, os homens, eles chamam a correr a palavra “recordações” e devagarinho começam de novo a sorrir.”
Graça Vilhena, Do lado de cá das fadas
Sem comentários:
Enviar um comentário