sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Um balão de oxigénio para o privado ou um direito das famílias?

O novo Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo abre as portas ao cheque-ensino. As declarações de Nuno Crato vão além do que o que está no diploma, este abre as portas a novas portarias e despachos que poderão levar a um maior apoio aos colégios, externatos e outras escolas do ensino particular e cooperativo.
Mas o que o ministro disse foi que - “o Estado não se restringe a apoiar turmas, como existe neste momento com os contratos de associação, mas também apoia alunos, o que abre um caminho mais directo a uma liberdade de escolha e a uma concorrência entre escolas e entre sistemas”.
Há quem acuse o ministro de querer ajudar o privado a sobreviver num momento de crise, de o cheque-ensino ser um balão de oxigenado para os colégios que vêem os alunos debandar porque a escola pública ainda fica mais barata. Talvez... Contudo, Crato sempre defendeu a livre escolha.

As escolas privadas são melhor do que as públicas? Algumas, só algumas e devido ao contexto onde estão inseridas. Não é por acaso que os lugares dos topos dos rankings têm escolas privadas e públicas que, muitas vezes, são vizinhas - servem o mesmo público.
Haverá escolas públicas com a preocupação de algum privado de querer conhecer o aluno como um todo e não tratá-lo como um número, uma coisa? Provavelmente. Haverá privados que se estão a marimbar para os alunos? Claro que sim. Não é tudo preto ou branco, há muitos tons de cinzento pelo meio. Há privados que expulsam os alunos que não interessam, assim como públicos.
Preocupa-me que com o cheque-ensino as escolas privadas possam escolher os alunos? Mas elas já o fazem. Aliás como as públicas também os escolhem e até decidem as turmas com base nas suas escolhas...
Preocupa-me que com o cheque-ensino as escolas públicas fiquem às moscas porque as famílias vão escolher os colégios? Não, se a escola for realmente boa - não só os espaços físicos mas o corpo docente, não se debaterá com esse problema. Já se for uma escola menos boa, precisa de se rever, de auto-reflectir, de mudar para segurar os seus alunos. Os professores têm de se preocupar com isso? Têm.
Preocupa-me que com o cheque-ensino o desemprego docente aumente? Não, porque este Governo está já a tratar disso. Aliás, as medidas de aumentar turmas, agrupamentos, excluir disciplinas e áreas não disciplinares e tudo o mais que venha há-de contribuir mais para o aumento do desemprego entre os professores do que o cheque-ensino.
É uma medida ideológica? Sim, como são todas as medidas políticas.
É uma medida que pode contribuir para um crescimento do fosso entre os pobres e os ricos? Talvez não, porque no ensino público há escolas de elite como há no privado - ou seja, não é igual para todos, nunca é igual.
Corremos o risco de ter escolas de primeira e de segunda? Mas não existem já? No público e no privado?
Desenganem-se os pais que acreditam no contrário - é sempre a escola que nos escolhe, a nós e aos nossos filhos, com ou sem cheque-ensino. As escolas privadas assumem esse poder, as públicas são mais discretas no seu uso.
BW

7 comentários:

  1. Olá Bárbara, é justamente pela sua conclusão que se justifica a preocupação com uma política educativa que não acautele o direito dos miúdos, de todos os miúdos, a uma educação de qualidade, seja em ensino público, seja em ensino privado. Dito de outra maneira, o MEC não pode, não deve, caucionar ou implantar modelos que comprovadamente não promovam equidade e, de forma mais ou menos encoberta, alimentem formas de guetização em, repito, estruturas públicas ou privadas.
    Um abraço

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    1. O texto de Maria de Lurdes Rodrigues no PÚBLICO é muito claro e esclarecedor sobre este tema: http://www.publico.pt/sociedade/noticia/igualdade-para-mais-liberdade-1605366

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  2. Embora nem sempre esteja de acordo com o que aqui se escreve (mas reconheça o mérito deste blog e goste muito de o ler), apreciei muito a forma realista como colocou as questões. A realidade tem muitos tons de cinzento pelo meio e é desta forma honesta e lúcida que a questão deveria ser abordada, sem ideologias e outros "ismos".

    Um abraço

    Paula

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    1. Obrigada, é sempre bem-vinda a discordar e a dizer que discorda! BW

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  3. É sempre a escola que nos escolhe.
    Então qual a finalidade do cheque ensino, se nunca podemos escolher?!
    F Motta

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    1. A finalidade é ajudar as famílias cuja escola escolhe! Como diz hoje a ex-ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues num texto de opinião no PÚBLICO: entre um rico e um pobre a escola escolherá o rico e o Estado dará dinheiro a essa pessoa para pagar a escola. BW

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  4. "Entre um rico e um pobre a escola escolherá o rico e o Estado dará dinheiro a essa pessoa para pagar a escola.". Ora é precisamente isso que me parece que acontecerá se existir o tal contrato do Estado com as famílias, para um apoio financeiro directo aos alunos.

    Várias questões ficam por esclarecer no anúncio do Ministro:
    1) Como é que as escolas públicas poderão fazer face à concorrência das privadas se, como o próprio diz, os melhores alunos (ou as famílias mais empenhadas, ricas ou remediadas) escolherem as privadas? Se as públicas ficarem sempre com os "piores", como poderão melhorar?
    2) Se o apoio dado pelo Estado não for o custo integral do aluno no privado, como é que os mais pobres se podem arrogar os mesmos direitos que os outros alunos todos, se não dispõem desse "extra"?
    3) Onde é que está a autonomia das públicas se há cada vez menos professores, mais alunos por turma, metas curriculares e programas constantemente revistos e impostos de cima, exames e testes intermédios nacionais obrigatórios... Ou será que autonomia quer dizer exactamente "desenrasquem-se como puderem, não vos damos nem mais um tostão"?
    4) Serão os critérios de selecção dos alunos nas privadas alvo de legislação?
    5) Serão os proprietários/gestores das escolas privadas alvo de inspecção/controle por parte do Ministério da Educação/Ministério das Finanças? A história do grupo GPS ainda está muito mal contada...

    A lista de questões é extensa, não vou ocupar mais espaço. Imagino que a discussão pública vá durar muito e seja (espero) proveitosa.

    Marta, Lisboa

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