quarta-feira, 4 de maio de 2016

Contratos de associação: sim ou não?

Nota histórica: os contratos de associação nasceram numa altura em que a rede das escolas públicas não chegava a todo o lado. Assim, o Estado contratualizou com escolas privadas que existiam nas regiões, pagando-lhes para receber todos os alunos. Portanto, estes não pagam mensalidades porque é o Estado que as paga, como se de uma escola pública se tratasse.
Com o passar do tempo, o Estado construiu escolas, em algumas regiões duplicou a oferta, uma vez que esta já existia. A isto devemos chamar "má gestão". Mas não é assim que a esquerda interpreta – tudo, mais cedo ou mais tarde, cai na ideologia. A isso a esquerda chama "oferta pública". Como se o que as escolas privadas fazem não fosse escrutinado pela Inspecção-Geral da Educação, como se não tivessem de dar as mesmas matérias que as públicas, como se os seus alunos não tivessem de fazer os mesmos exames.
Mas a história não fica por aqui e, paralelamente à construção de escolas públicas, o mesmo Estado – é preciso ver que este nem sempre é o mesmo porque umas vezes é o PS que o gere, outras é o PSD/CDS – autorizou mais contratos de associação em colégios ao lado de escolas públicas e mais: permitiu que novas privadas conseguissem estes mesmos contratos. Má gestão, repito.

Depois de viverem dias calmos com Nuno Crato, as escolas privadas com contratos de associação estão em alvoroço com a possibilidade de perderem os contratos, logo, o financiamento.
Há contratos que são vergonhosos, os do centro da cidade de Coimbra, com escolas públicas ao lado! O das Caldas da Rainha onde a escola pública já existente ficou às moscas desde que a privada abriu, recentemente.
Mas aqui é que está o ponto: por que está a escola pública às moscas?
E devia ser sobre isso que as públicas que querem os alunos das dos contratos de associação deviam reflectir, em vez de acharem que têm o direito porque o "ensino é público". Repito: porque está a escola pública às moscas?
Outros pontos sobre os quais podem reflectir:
O que faz a escola pública para bem receber os alunos?
O que lhes oferecer em termos de actividades extra-curriculares?
Tem um corpo docente estável e disponível para tudo?
Tem recursos físicos e humanos para que os alunos fiquem até mais tarde?
Como é a sua relação com os pais? Ouve-os, trata-os bem?
Tem transporte?

Há escolas com contratos de associação más? Há, basta olhar para os rankings e elas lá estão. Há escolas com contratos de associação que escolhem os alunos? Sim, como há públicas que o fazem, mesmo que jurem a pés juntos que não. Há escolas com contratos de associação que exploram os seus professores? Há, têm sido denunciadas pelos sindicatos.
Mas também há escolas com contratos de associação que recebem os alunos que as públicas não querem ou os que as públicas desistiram.
Um amigo do meu filho esteve numa escola com contrato de associação com uma equipa de atletismo fortíssima – ah, pois, os privados podem ter essas coisas, dirão já os invejosos. Mas os públicos não têm porquê? Porque não querem, não é por falta de condições visto que todas as escolas têm pavilhão desportivo e departamento de educação fisica.
Voltando ao amigo do meu filho. É um rapaz de uma família pobre de uma ex-colónia, de um bairro complicado, que noutra escola teria poucas possibilidades porque estaria, à partida, condenado ao insucesso. Nesta escola com contrato de associação foi integrado, a escola percebeu que o miúdo tinha jeito para o desporto, pô-lo a praticar uma modalidade que pode levá-lo longe, e, entretanto, entrou na universidade, com bolsa, conseguida com a ajuda da escola que preparou todo o processo – ah, mas as privadas têm condições que as públicas não têm, onde é que numa pública podemos ajudar os meninos a ter bolsas... Mas não existe um gabinete de acção social?
Portanto, se este miúdo não tivesse sido verdadeiramente integrado, não lhe fosse traçado um projecto de vida, provavelmente poderia fazer parte daquele grupo de 30 que queria, à força toda, comer às sete da manhã no Palácio dos Kebabs, em Santos, em Lisboa, e como não lhe foi feita a vontade destruiu e roubou.
Esses rapazes, possivelmente com o mesmo background que este miúdo, não andaram na escola? O que é que a escola fez por eles, já que as famílias nada fizeram?

Mas todas as escolas com contratos de associação são bons exemplos de integração? Claro que não! E todas as públicas são um mau exemplo? Também não. O que quero dizer é que se a escola cumprir o seu papel – se em vez de os directores estarem preocupados em agradar ao seu corpo docente, se preocuparem com os alunos e as famílias –, certamente que os pais vão querer que os filhos fiquem na pública ao lado de casa, em vez de meterem os miúdos nos autocarros para irem para a privada com contrato de associação que fica a 25 km de distância.

O desafio é deixar as leis do mercado funcionarem! Mais: se eu fosse o Ministério da Educação, em vez de apregoar que os contratos são para acabar, para gáudio da Fenprof, do PCP e do BE, punha a IGE no terreno, a reflectir com as públicas que estão às moscas e com as privadas que têm maus resultados. Porque se a rede inclui públicas e privadas, por que hão-de ser as privadas a fechar as suas turmas, só para que se mantenha o peso da máquina do Estado? Enquanto este for conivente com as suas clientelas não lhes exigindo nada em troca, a escola não muda e, por consequência, a sociedade tende a piorar.
BW

15 comentários:

  1. Será assim tão "simples", Bárbara?

    ResponderEliminar
  2. Um Amigo meu confrotado se era de esquerda ou direita,respondeu "Sou inteligente".Parabens pela sua clarividencia e honestidade intelectual

    ResponderEliminar
  3. Bárbara Wong, tirou-me as palavras da boca. Tal e qual!

    ResponderEliminar
  4. Sigo inteiramente o seu pensamento, com a exceção do que refere: “Há contratos que são vergonhosos, os do centro da cidade de Coimbra, com escolas públicas ao lado!” Falo pelo Colégio de São Teotónio, construído em 1963. Depois de ter assinado contrato de associação, foi construída a escola básica de Ceira, a escola de São Silvestre e, recentemente, foram ampliadas as escolas D. Maria e Avelar Brotero; a secundária D. Maria e José Falcão passaram a receber 3º ciclo. Má gestão, portanto, ao criar respostas onde elas existiam, ampliando a oferta. Recordo que os contratos de associação assinados com as escolas do Centro da Cidade previam: Colégio de São José, 5 turmas; Colégio Rainha Santa, 15 turmas; Cooperativa de Ensino, 10 turmas; Colégio de São Teotónio, 15 turmas. Destas, atualmente, abrangem: Colégio de São José, 3 turmas; Colégio Rainha Santa, 8 turmas; Cooperativa de Ensino, encerrou no ano passado; Colégio de São Teotónio, 7 turmas. Na altura não havia capacidade para acolher estas 45 turmas, das quais restam apenas 18. Ajustamento superior a 50%, sendo a parte mais significativa responsabilidade do anterior governo.
    Perguntar-me-á: Mas porque está a escola de Ceira, construída depois dos contratos, e a Escola Silva Gaio, já existente, sem alunos, quando as outras escolas da Cidade, estatais e privadas não têm esse problema? Simplesmente porque quem vive nesta zona e tem crianças em idade escolar não é tonto!

    ResponderEliminar
  5. Discordo de muitas coisas, sendo impossível comentar em poucas palavras.
    Respondi no meu blogue, em https://escolapt.wordpress.com/2016/05/05/carta-aberta-a-barbara-wong/

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Lido António Duarte, tem razão, saltei a história e esqueci-me do boom da década de 1980. Não respondo na sua chafarica porque tinha de me inscrever, uma trabalheira... De resto é a sua opinião, mesmo a parte em que me acusa de demagogia! Como calcula não penso que a culpa dos marginais e de todos os males da sociedade seja inteiramente da escola. A BW não é assim tão demagoga! Mas a escola pode fazer mais por eles e quem lhe disse que acho que o projecto de vida de todos estes miúdos é o desporto? Está a ser preconceituoso ou a querer acusar-me a mim de preconceito? O que fazem as orquestras geração, sediadas em escolas públicas? Dão perspectivas na área da música! O que digo é que a escola pode fazer mais e a minha experiência enquanto jornalista é que há muitas que fazem das tripas coração; e outras que se estão a borrifar, encolhem os ombros e desculpam-se com o meio sócio-económico. Públicas e privadas, sem distinção - e isso esquece-se de sublinhar na sua análise, porque não lhe interessa. O que lhe interessa é acusar-me de demagogia e neoliberalismo (está tão enganado!). O que digo é que há membros da classe docente cuja única preocupação é dar a matéria, estejam os miúdos atentos ou não; e outros que querem saber quem têm à frente, o que querem fazer na vida, o que a escola pode fazer por eles para que sigam os seus sonhos e aos que não os têm, procuram encaminhá-los. E esse trabalho é que faz com que a nossa sociedade evolua e cresça. Se tivermos professores mediocres, temos uma sociedade mediocre. Se tivermos pais mediocres, temos uma sociedade mediocre. Mas se tivermos pais mediocres e professores que se preocupam com os filhos desses pais, talvez essas crianças e jovens sejam um pouco melhores - aprendam um desporto, música, leiam, vão ao cinema, em vez de estarem presos às redes sociais ou à televisão a verem coisas miseráveis (os meios de comunicação social também têm responsabilidades!). E é essa responsabilidade que alguns professores se recusam a ter. Estão no seu direito. E enquanto tiverem um ministério que os protege, dormem descansados e dormirão sempre porque quando algum ministro se atrever a querer mexer-lhes virão 120 mil para a rua, indignados.BW
      PS: E como vê pelo comentário antes do seu, nem os defensores dos contratos de associação estão de acordo comigo. E isso deixa-me satisfeita porque é sinal que não sou totalmente demagoga e tento ser imparcial, uma caracteristica que aparentemente só os jornalistas conseguem ter porque estão de fora e têm uma visão global das coisas.

      Eliminar
  6. Se calhar a srª jornalista não ouviu as partes todas...
    Deu- se ao trabalho de ver a reportagem de TVI sobre os contratos de associação feita há anos? A situação que relata é muito particular do filho do seu amigo. Como é evidente as escolas públicas não podem oferecer as mesmas condições dos privados, visto que não têm à sua disposição os mesmos meios. Sabia que há colégios que vão buscar as crianças de forma gratuita a casa? E fora da sua área de residência? Desta forma, também eu gostaria de ter os meus filhos nestes colégios? Nas escolas públicas, os pais têm de pagar os transportes do seu bolso.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. A sra jornalista não está a exercer a sua função de jornalista, mas de pessoa com opinião - este é um blogue pessoal. Contudo, a sra jornalista já leu, ouviu e viu muitas peças sobre este tema. Já falou com todas as partes, inclusive a sra jornalista já foi a essas escolas, onde viu alunos de todos os meios sociais. Aliás, hoje o PÚBLICO tem uma reportagem sobre o colégio de Cernache onde é dito que um quarto dos alunos são de meios desfavorecidos http://www.publico.pt/n1731136 Portanto, o caso que relato não é "muito particular".
      Não compreendo por que acha "evidente" que as escolas não tenham as mesmas condições, públicas e privadas. Afinal se o Estado está a pagar turmas nestas escolas, se o Estado as financia tal como financia a pública por que não têm as mesmas condições? Não me diga que além de privados também são melhores gestores da coisa pública? Bem, a verdade é que nos privados pagam menos aos professores e aqueles trabalham mais. Talvez esteja aí o segredo do seu sucesso. Quanto aos transportes, várias autarquias os fornecem, sobretudo para o 1.º ciclo. Por isso, não é exclusivo do privado. É verdade, nas públicas pagamos os transportes, no meu caso a factura duplicou quando o Executivo PSD/CDS resolveu acabar com o passe para os estudantes, a metade do preço, porque estudar é um luxo, mesmo na escola pública.

      Eliminar
  7. querem escolher fora do sistema gratuito e Universal, abram os cordões, como acontece em tudo. Os contratos só se justificam onde não há rede do estado.

    ResponderEliminar
  8. Realmente as escolas privadas realizam um trabalho extraordinário, de tal modo que todos os alunos problemáticos deveriam ser para lá encaminhados, uma vez que a escola pública é incompetente. Talvez se isso acontecesse os resultados dos rankings passassem a ser mais verdadeiros.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Há alunos problemáticos que as privadas rejeitam e vão para as públicas, assim como o inverso também acontece. Há muitos tons de cinzento entre o preto e o branco!

      Eliminar
  9. Foi dito no Parlamento que “o Governo preferia esvaziar a carga ideológica do debate entre ensino público e privado, centrando a discussão apenas na questão do financiamento e da gestão do Orçamento do Estado”. Também diz o ministro Tiago Brandão Rodrigues que "Nada nos move contra os agentes privados da educação". Óptimo! E depois?

    Ora, o problema do financiamento e da gestão do Orçamento do Estado só existe porque sucessivos governos persistem em pensar no financiamento dos custos da educação em termos do financiamento das escolas, quando o que se impõe é garantir o financiamento aos alunos, através das suas famílias. Ou seja, o financiamento “tem de ir atrás” dos alunos. O financiamento é necessário para pagar os recursos (professores, pessoal não docente, equipamento, edifícios, etc.) escolhidos pelos alunos e suas famílias e não para onde os governos decidem. Uma vez estruturado o financiamento em função das escolhas dos alunos e das suas famílias, qualquer distinção entre escolas geridas pelo Estado ou por entidades cooperativas ou privadas torna-se irrelevante. É isso que crescentemente tem vindo a acontecer nos países mais avançados do mundo.

    Sejamos, pois claros. O que interessa é saber como, em termos práticos e não retóricos ou ideológicos, devemos garantir o cumprimento das cláusulas sobre liberdade de educação consignadas na nossa Constituição, destinada a todos os portugueses sem excepção, incluindo, portanto, aos que têm menores recursos. Pergunto: o artigo 43.º da Constituição da República Portuguesa, que nos diz “ser garantida a liberdade de aprender e ensinar" e que "o Estado não pode programar a educação e a cultura segundo quaisquer directrizes filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou religiosas", é ou não para ser cumprido na prática? E como é que isso se faz?

    Alguém considera que a Constituição tem vindo a ser respeitada pelos sucessivos Governos? Ou será que consideramos que estas cláusulas existem apenas para “podermos dizer que defendemos a liberdade”? Infelizmente, sucessivos governos têm desrespeitado estas cláusulas, esquecendo que quem na prática não respeita estas cláusulas acaba por ser na prática inimigo da liberdade. Afinal, a liberdade nunca se perde de uma só vez. Perde-se aos poucos! É o que a História nos ensina!

    É evidente que não é possível mudar de uma só vez a estrutura do financiamento, deixando de ser dado às escolas que o Estado escolhe, mas às escolas que os alunos e as suas famílias escolhem. “O caminho faz-se caminhando” e o que os portugueses têm de exigir é que os sucessivos governos dêem passos concretos no caminho certo e não lhes atirem areia os olhos.

    ResponderEliminar
  10. Obrigado Barbara, pois é isto tudo que devia estar a ser resolvido e nem se fala na comunicação social, obrigado porque tenho muitos destes na minha escola. e provavelmente vai sobrar para a minha escola que tanto faz pela educação e formação. muito obrigado.

    ResponderEliminar
  11. Tanta asneira junta. O estado está obrigado pela constituição a estender a rede publica a todo o pais. Estes colégios fizeram educação um negócio, maltratam os seus professores, exploram-nos, baseiam a sua ação na imagem, contruiram uma frota de autocarros de luxo, servem uma classe média que tem dinheiro para escolhero privado mas assim é mais barato. Há colégios destes que cobram apoios, clubes e até a frequência do desporto escolar que devia ser um direito de qualquer aluno. Caros bloggers é só de dinheiro que se trata o resto é treta, demagogia... Sabe tão bem invocar a liberdade de esclha quando nada se faz por ela. Estes colégios são na sua maioria uma máfia com ramificações politicas e religiosas. O azar foi isto virar à esquerda rodaavam as cadeiras no centrão e o dinheirinho estava garantido para os colégios (até o nome colé gio mereceria reflexão)... Deixemo-nos de tretas o estado deve-se concetrar na escola publica os privados que se concentrem no ensino privado...

    ResponderEliminar