Poucos dias após o Ministro da Educação ter afirmado que "Os exames não são a finalidade das aprendizagens", algo que, na verdade, deve ser tido em conta ao longo do ano letivo, em que tantas vezes se trabalha para o programa-metas e exame, recomeça uma nova ronda de exames.
Menos "nova" para os professores que já conhecem os processos (e vícios) do sistema; nova, claro está, para cada aluno que, por muito que tenha treinado em aula, nunca é a mesma coisa o que pensa e sente numa simulação de exame em casa ou aula, relativamente ao que sente no dia D, o dia do Exame. (Malgrado a analogia, é como nos concursos televisivos, em que os concorrentes afirmam que, no sofá, em casa, as perguntas parecem sempre mais fáceis.)
A nova ronda começou com o exame nacional de Português do 12.º ano, logo pela manhã, num dia ensombrado pela tragédia de Pedrogão Grande. E prosseguiu com Filosofia, no calor crescente da tarde.
Concordando com a opinião geral de alunos e professores sobre o exame de Português relativamente ao adequado grau de dificuldade do mesmo, destacaria quatro ideias.
Em primeiro lugar, o belíssimo poema de Alberto Caeiro escolhido não precisaria, a meu ver, de ter como fonte a edição de FCM e R. Zenith, considerando que nesta a palavra "constrói" surge como "construi" (ver transcrição infra). Tratando-se de uma variação percetível, sobretudo se considerarmos a nota que acompanha o poema (ainda que sem numeração ou asterisco no texto!), creio que no dia de um exame se devem evitar estes preciosismos formais que, obviamente num curso de literatura fariam sentido, mas que, numa disciplina de natureza geral e obrigatória, a meu ver, se não justificam.
Em segundo lugar, creio que o grupo III, referente à produção de um texto argumentativo, o tema proposto, as memórias, permite recuperar uma temática programática do 10.º ano, assim, subtilmente e de forma harmoniosa e articulada, aferindo a capacidade de reflexão sobre este tipo de textos de natureza autobiográfica.
Em terceiro lugar, o apelidado grupo da gramática (em que também se avalia a interpretação) partiu de um texto sobre a ciência enquanto forma de conhecimento e desenhando-se neste uma aproximação entre as artes e a ciência pura e dura. Feliz escolha, senti eu ao ler o texto. Eu, que tive turmas de ciências o ano inteiro e que tantas vezes procurei mostrar aos meus alunos como as inquietações dos cientistas e dos artistas são, na verdade, muitas vezes as mesmas. (Alguns terão pensado: podia ter sido a minha professora a escolher este texto. E é verdade que podia!)
Por último, e nostalgicamente, foi bom reencontrar Virgílio Ferreira num exame, ainda que a propósito do texto autobiográfico.
Em síntese, o exame apresentou textos inquestionavelmente pertinentes, adequados ao nível de avaliação em questão e em harmonia com o programa.
Assim começou uma nova ronda de exames.
Votos de sucesso para os alunos.
Entretanto, aqui fica o link do IAVE, onde, sobre o calendário e respetivos dias podem encontrar as provas e as suas soluções, e o poema de Caeiro, para os mais curiosos.
XXXVI
E há poetas que são artistas
E trabalham nos seus versos
Como um carpinteiro nas tábuas!...
Que triste não saber florir!
Ter que pôr verso sobre verso, como quem construi (constrói) um muro
E ver se está bem, e tirar se não está!...
[...]
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